RAWI comenta experiência única no disco “Facão Que Abre os Caminhos”

Luca Moreira
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RAWI (Foto: Bárbara Vale)

Celebrando a jornada de seu disco “Facão Que Abre os Caminhos”, lançado em julho de 2021, o cantor e compositor queer paraense RAWI faz mais um mergulho visual nas canções do álbum, desta vez dando destaque a “PinkNCSJ”. O trabalho já está disponível nas principais plataformas, e o clipe chega ao canal de YouTube do artista.

O título da canção é uma abreviação de “Pink Night Colônia São José”. Com uma letra sentimental e sonoridade experimental, a faixa bebe da fonte de estilos tão diversos quanto o tecnobrega e o boombap, o drum n’ bass e o reggaeton, tudo passado pela lâmina de um olhar nortista com uma letra forte e elementos das crenças e expressões populares, como as espadas de São Jorge e Santa Bárbara e os tajás de proteção.

“PinkNCSJ” fala sobre um menino buscando afeto e tentando criar a partir desses amores uma fórmula perfeita, algo que é impossível e acaba sendo mostrado no videoclipe. A personagem mergulha intensamente na paixão e na exacerbação de querer alguém na potência máxima.

Dialogando com a era “Facão” de seu trabalho, o artista traz elementos que remetem à estética do álbum, como a palha, a paleta de cores e as luvas. Porém, tudo tem outro tom: o chapéu antes em seu formato clássico, agora desmontado, recortado e reconstruído vira um vestido “armadura”, e um headpiece com espinhos. As luvas vindo com assimetria, são sobrepostas de materiais queimados e derretidos, sinalizando o fim de algo para se tornar outro, mesma estética aplicada à bota. O visual anos 2000 ganha ares futuristas e desemboca num pós-punk amazônico. Confira a entrevista!

Revivendo um dos maiores sucessos do álbum “Facão Que Abre os Caminhos”, esse ano, você está realizando uma releitura do single “PinkNCSJ”. Como tem sido dar essa nova interpretação a faixa e o que mais atraiu sua atenção para ela em específico?

PinkNCSJ vem como o último ato do álbum ‘Facão Que Abre os Caminhos’, produzido por mim e pelos produtores musicais Dell Parker e Jorrannis. Escrevi a letra e pensei na composição que trouxesse novas características para o universo de ‘Facão’, porém dialogando com símbolos já trabalhados. Tenho muito apreço por ela e em como tudo se transformou até o último momento.

Sendo o nome uma referência abreviada para “Pink Night Colônia São José”, você poderia contar um pouco mais sobre como foi a história dessa música?

A primeira faísca de PinkNCSJ nasceu junto da capa do álbum. Antes da letra e de imaginar as experimentações sonoras e como o clipe iria acontecer, esse nome surgiu. A capa com um intenso rosa, em uma noite, no São José, comunidade que morei por alguns anos da infância e onde familiares ainda moram. Essencialmente surgiu aí, e bem depois do álbum ser lançado comecei a traçar que caminhos essa música iria percorrer no âmbito sonoro-visual, e que tivesse engates com a própria era ‘Facão Que Abre os Caminhos’.

RAWI (Foto: Bárbara Vale)

Além do uso de elementos como as espadas de São Jorge e Santa Bárbara como tajás de proteção, “PinkNCSJ” aborda um enredo de aventura onde um menino em busca de afeto, tenta recriar amores a partir de uma fórmula perfeita. Na sua opinião, existe um conceito exato do que seria esse amor?

O amor apresentado na música, uma fricção, é tipo aquele arder no peito. Na vida não existe fórmula e nem perfeição, e chega a ser engraçado tentar vislumbrar na arte alguma possibilidade disso existir. É aquele amor que a gente sente tudo pegando fogo, no bom e no mau sentido, uma vontade de prender e proteger esse amor a todo custo, de não perder essa euforia tão avassaladora. Do vício no mais cru do outro.

Remetendo a era “Facão” do seu trabalho, você optou por trazer diversos elementos que remetesse à estética do seu álbum, como a palha, paleta de cores e as luvas, porém, dessa vez teve o acréscimo de outros elementos. Como define essa nova era da sua carreira que está vivendo?

Sinto que precisei absorver tudo de Facão e recorrer à intuição para elaboração de novas imagens com símbolos já apresentados. PinkNCSJ é esse fecho, é o processo da cortinas se fechando para tudo que criamos, eu e uma equipe enorme de artistas independentes daqui de Santarém. E ser independente é desafiar nossas próprias dicotomias para a criação de algo maior do que nossa própria pretensão. PinkNCSJ é essa energia da experimentação sonora, que foi abraçada em Facão, um entusiasmo pela simbiose das ideias e práticas.

RAWI (Foto: Bárbara Vale)

Dedicando-se desde 2012 a carreira nas artes, além de cantor, você também já fez trabalho como ator e artista plástico. Voltando um pouco no tempo, poderia nos contar um pouco sobre como foram os seus primeiros contatos com a arte e a partir de que ponto percebeu que poderia vivê-la como sua profissão?

Acho que todo mundo passou por aquele momento de vivenciar a arte antes mesmo de saber o que é, assim foi comigo. Meu avô tocava muito violão quando eu era criança, não necessariamente para mim, mas aquilo fazia parte do dia, de uma espécie de cotidiano sagrado. Acho q meu primeiro enlace deve ter sido aí, mas o arrebatamento foi no teatro em 2012, com 12/13 anos. Entendi meu corpo se movendo para esse encaixe que é estar disposto a se entregar para o palco e não parei mais, não quis parar. A música me acompanhou nas entrelinhas, assim como a composição e a poesia. Acho que hoje vivo nessa intensa mistura das habilidades que desenvolvi durante esses anos, e só foi virar profissão a partir de 2019, quando a música entrou revolucionando tudo. De lá pra cá lancei meu álbum, meu filme e participei de festivais de música e cinema.

A respeito de seu estilo musical, você costuma estar sempre explorando novos ritmos que buscam uma alternativas em meio a arte Queer Amazônida. Poderia explicar um pouco mais a respeito do que se trata esse estilo?

Acho que faço arte desde sempre porque posso ter liberdade de experimentar com o que já existe e com essa euforia de brincar com o talvez, com o que pode surgir a partir das junções inusitadas e contrastantes. Defino minha música como pop experimental, o que me deixa livre para ser livre. É sobre o que me toca e o que eu quero dizer naquele momento de criação, que pode mudar durante o processo. E isso tá entrelaçado nessa definição de arte Queer Amazônida, porque essas duas palavras me atravessam e me constroem, ao invés de me limitar. Creio que por enquanto estou criando mais perguntas do que buscando respostas sobre o que faço.

RAWI (Foto: Bárbara Vale)

Com uma mistura que vai desde o tecnobrega, passando para o drum n’ bass e o reggaeton, o seu estilo musical está se mostrando sempre bastante eclético. Nesse caso, como você se definiria como artista passando por todas essas transformações musicais?

Tudo vai me influenciando durante o caminho da construção, tudo pode virar intenção. Tento filtrar, tento recorrer aos recortes, mas tenho essa vontade de brincar com o que parece já estar tão estruturado. Quero fazer música como uma pintura, cada cor um ritmo, da mistura novas cores, às vezes basta uma tela bicolor, mas tem momentos que preciso derramar todas as cores do mundo.

Falando um pouco mais sobre sua carreira, quais têm sido os seus planos a curto, médio e longo prazo atualmente?

Quero muito fazer mais música, e viver essa experiência com outros artistas. Tenho meu segundo álbum escrito, pronto pra ir para o processo efetivo de construção, mas antes dele nascer para o mundo, quero viver outros palcos, olhar nos olhos de outros públicos e mais música e mais música.

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*Com Andrezza Barros

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