Professor titular da UNICAMP, Paulo S. Oliveira, conhecido por seu domínio na Ecologia, expande seu talento além das fronteiras acadêmicas ao lançar “O Amor Urbano”, seu primeiro livro de contos. Esta obra revela uma faceta criativa de alguém habilidoso com as palavras, porém, até então, mais focado no universo da biologia. Editado pela Telha, o livro apresenta uma coleção de dez histórias, situadas em cenários diversos do Rio e de São Paulo, que servem como palcos perfeitos para um mergulho no universo do Amor Urbano. Estes contos capturam o cotidiano das pessoas na agitação das metrópoles.

Os encontros e desencontros acontecem em diferentes locais – cafés, bares, bancas de jornais, praias, gafieiras, locais de trabalho, farmácias, garagens de prédios, academias – moldando a vida dos personagens. Nestas narrativas, desvendam-se descobertas, romance, paixão e intimidade, mas também há espaço para desencontros, traições, mágoas e hostilidades. Amor e desamor, desejos ardentes e conflitos envolvem os personagens, trazendo à tona realidades de Rio e São Paulo – ressaltadas por ilustrações marcantes que enriquecem a leitura.

Os contos exploram temas variados, desde assédio sexual no ambiente profissional, bissexualidade, homossexualidade, racismo, violência urbana, violência doméstica, até prostituição masculina e feminina, alcoolismo, adoção infantil e psicoterapia. O enredo perpassa por bairros de diferentes classes sociais no Rio e São Paulo, com breves passagens por Miami, Toulouse, Barcelona e Nova Iorque. Embora apresentem personagens masculinos e femininos, as mulheres têm destaque. “O Amor Urbano” é uma reunião de tudo o que há de melhor, pior e mais inusitado em encontros e desencontros nas grandes metrópoles.

Paulo S. Oliveira, professor titular de Ecologia na UNICAMP, é formado em Biologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e possui mestrado e doutorado em Ecologia pela UNICAMP. Com pós-doutorado pela Harvard University (EUA) e pela Universität Würzburg (Alemanha), já publicou três livros de Ecologia em colaboração com pesquisadores internacionais pela Columbia University Press, University of Chicago Press e Cambridge University Press. Foi presidente da Association for Tropical Biology and Conservation (EUA). Sua trajetória na Ecologia o levou a viver nos Estados Unidos, Alemanha, França e México, e a explorar a Amazônia, Pantanal, Cerrado e Mata Atlântica, sempre focado em estudar as formigas. Observar pessoas, a si mesmo e a natureza são suas paixões, pois a vida e o aprendizado se revelam nesses olhares atentos.

Como a transição de escrever sobre Ecologia para contos românticos e urbanos aconteceu? Quais foram suas principais inspirações?

Acho que minhas fontes de inspiração foram a minha profissão, o ambiente urbano onde cresci, e a imaginação do adolescente e do adulto. Somado a isso, sempre li romancistas brasileiros e estrangeiros, e sou muito ligado na nossa música.

Como pesquisador e professor na área de Ecologia, ao longo da minha carreira eu desenvolvi um senso de observação da natureza que envolve detalhes diversos do comportamento dos animais e das relações entre eles. Minhas anotações incluem como os bichos procuram alimento, como perseguem e capturam suas presas, como se defendem de inimigos, onde se abrigam do perigo, onde procuram e como se exibem para o/a parceiro/a sexual, como enfrentam os/as rivais, como cuidam da prole.

Desde cedo eu desenvolvi a curiosidade de observar as pessoas no ônibus, no metrô, no banco da praça, abraçados na lambreta, no baile, no chamego… e então imaginava seus desejos, suas carências, se pareciam felizes, e como seguiriam com suas vidas. Assim eu construía minhas fantasias e inventava histórias na minha cabeça…

Eu cresci no Rio de Janeiro e, já adulto, meu trabalho permitiu que eu conhecesse todos os cantos do Brasil – urbanos e naturais. A Ecologia me levou a viver nos Estados Unidos, França, Alemanha e México – conheci muita gente, vivi culturas diferentes, e aprendi com a diversidade. Crescia o desejo de contar histórias de encontros e desencontros no ambiente urbano…

A efervescência da cidade grande me encanta – o flerte e a sedução correm soltos em todos os cantos, dia e noite… Vem o fogo da paixão, alegrias e tristezas sobem à flor da pele, e mudam vidas. Escrever sobre o amor urbano estava na minha cabeça há tempos – o momento chegou!

“O Amor Urbano” explora diversas temáticas sociais contemporâneas. Como esses temas se entrelaçam nas histórias e qual a mensagem que você espera transmitir aos leitores?

As minhas histórias fazem parte da vida das pessoas na cidade grande. As diversas temáticas e contextos estão nos jornais e na mídia em geral do nosso dia a dia. O que fiz foi construir personagens dentro de diferentes contextos – bairros, classe social, gênero, nível cultural, ambiente doméstico, ambiente da rua, faixa de idade, profissão, dentre outros – e promover os encontros e emoções resultantes.

Não escrevi as histórias com a intenção de transmitir mensagens – apenas quis contar a vida das pessoas, e de suas relações, no ambiente da cidade grande, tendo o Rio e São Paulo como cenários.

O que mostro nas histórias são as maneiras diversas que as pessoas lidam com suas vidas afetivas e seus desejos – sem qualquer juízo de valor de minha parte.

Com tantos cenários distintos, incluindo cidades internacionais, como Miami e Nova Iorque, como você escolheu os ambientes para cada conto e de que forma essas localidades influenciam as histórias?

Eu quis contextualizar as histórias em ambientes e cidades variadas – incluindo outros países – visando abranger situações de encontros casuais que podem acontecer com qualquer um de nós; seja na nossa cidade, fazendo turismo ou a trabalho no exterior.

Isto permitiu também criar personagens com perfis diversos. Como vivi fora do Brasil, pensei que cenários e episódios breves em cidades estrangeiras enriqueceriam a diversidade das histórias, dos contextos, e dos personagens.

Apesar de abordar uma variedade de tópicos, o protagonismo é dado às mulheres. Qual é a importância desse enfoque e como você aborda a complexidade feminina em suas narrativas?

Sempre tive mais fascínio por personagens femininos, e dei às mulheres um protagonismo maior nas minhas histórias. Achei que seria legal e oportuno abordar – do ponto de vista das mulheres – temas como sucesso profissional, assédio sexual no trabalho, prostituição e vida amorosa, sedução e desejo, homossexualidade, racismo, violência doméstica e abuso sexual. Estes são temas atualíssimos e senti vontade de enfatizá-los nas minhas histórias, dando protagonismo às personagens femininas.

Penso que há um predomínio de personagens masculinos na literatura e na mídia contemporânea. Fico feliz que minhas histórias expressem o poder e liderança de mulheres no ambiente de trabalho, na comunidade, e em suas vidas pessoais.

Como sua experiência como observador da natureza influenciou a forma como você observa e interpreta as interações humanas nos contos de “O Amor Urbano”?

Minha experiência pesquisando a natureza e escrevendo artigos e livros científicos na área de Biologia/Ecologia não me ajudou na interpretação de interações e emoções humanas – isto a gente aprende com a vida!

Posso afirmar, entretanto, que a experiência acadêmica – como pesquisador, escritor e professor – me ajudou muito na redação e estrutura das minhas histórias, visando clareza e foco, para manter o/a leitor/a interessado/a.

Paulo S. Oliveira

Há alguma história específica em “O Amor Urbano” que seja particularmente significativa para você? Pode compartilhar um pouco sobre ela?

Já pensei nisso – todas as histórias são igualmente importantes para mim. Eu adoro os contextos que inventei, os personagens e as tramas. Volta e meia leio de novo, e me delicio – os personagens ficam como filhos da gente… É uma sensação bacana!

Como o ambiente acadêmico e literário coexistem em sua vida? De que maneira um aspecto influencia o outro?

Os dois ambientes se complementam com harmonia, e me completam no plano pessoal e profissional – me ajudam a ser uma pessoa melhor e me aprimoram como cientista, professor e escritor.

Eu já havia escrito artigos e livros em ciência, e tenho verdadeiro fascínio pela carreira que escolhi – faria tudo de novo!

Entretanto, a experiência literária com O Amor Urbano me trouxe uma alegria nova, acendeu uma chama nova – o adolescente que imaginava histórias de amor encontrou o naturalista que observa a natureza. O equilíbrio é perfeito – a paixão acadêmica ajuda a paixão literária, e vice-versa…

Sendo um ecologista renomado, como você vê a conexão entre o meio ambiente e as histórias humanas nas narrativas urbanas que você cria?

A conexão que vejo é a seguinte: Os bichos fogem do perigo, sofrem com a dor, buscam o prazer. Nós também!

Quais são seus planos futuros no campo da escrita? Podemos esperar mais incursões no universo da ficção, ou há outros projetos em mente?

Tive que estudar muito para escrever O Amor Urbano – li muitos autores, segui orientações sobre estrutura de texto, tamanho de uma história, como se caracteriza os personagens, quantos personagens devem ter destaque, quantos devem ter nomes (‘muitos nomes’ não é bom), como descrever o cenário da história, como se começa-desenvolve-termina uma trama, etc.

Tenho planos de escrever uma história mais longa e já comecei a rascunhar umas ideias, caracterizar alguns personagens e suas profissões, cidades, encontros, conflitos. Agora vou ter que estudar para ver como estruturar uma história mais longa – com início, meio e fim – de modo a cativar corações e mentes.      Vamos ver no que isto vai dar…

Em que medida suas experiências de vida e de pesquisa influenciam a diversidade de personagens e experiências em “O Amor Urbano”?

De muitas maneiras. Dos 22 aos 30 anos eu percorri o Brasil inteiro fazendo minhas pesquisas – andei pela Amazonia, Pantanal, Cerrado e Mata Atlântica. Vi coisas belas e feias, conheci pessoas comuns, pessoas boas e pessoas fascinantes – nos campos, nas florestas, nos rios e nas cidades. Com a natureza e com a nossa gente eu amadureci muito pessoal e profissionalmente.

Entre os 31 e 43 anos eu viajei repetidas vezes ao exterior para congressos e passei períodos de aperfeiçoamento profissional em quatro países – Estados Unidos, França, Alemanha e México. Estas experiências foram fundamentais na minha formação pessoal e acadêmica. Além de fazer pesquisas em instituições científicas de prestígio, neste período pude conviver com pessoas de culturas variadas, em sociedades com costumes e valores diferentes dos nossos.

Hoje entendo que a Ecologia me permitiu não apenas conhecer o meu país e sua gente, como também colocou o mundo e sua diversidade humana e cultural ao meu alcance.

Minha visão de mundo vem da diversidade de culturas, costumes, manifestações acadêmicas, manifestações artísticas, e pessoas que conheci mundo a fora. Não tenho dúvida, O Amor Urbano vem de tudo isso!

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