Muito antes de conhecermos os blogueiros e youtubers de hoje, lá na década de 90, o que chamamos de digital influencer já nascia na cabeça da blogueira e apresentadora Mariana Lima, mais conhecida como MariMoon.

Considerada hoje uma das primeiras influencers do Brasil, ela começou a se interessar pela internet na época em que ainda estava no colégio, quando o fato de “estar conectado” ainda era um luxo. Para termos uma ideia, só quem tinha blog na internet era a galera que manjava muito de programação e do universo geek.

A presença de Mari no mundo virtual começou no final dos anos 90 com a simples intenção de manter contato com pessoas que tinham a ver com sua personalidade mais alternativa. Eram postadas coisas do dia-a-dia como experiências, pensamentos, dicas de filmes, e por ai ia na criatividade. Pra termos uma noção, nessa época o “pixelart” era o prinicipal trend do universo jovem.

Porém, o seu verdadeiro boom começou quando a extinta rede MTV a convidou para apresentar um quadro em que falaria dos assuntos da rede. Foi a primeira vez que apareceu em rede nacional.

Ganhadora consecutiva do prêmio Capricho Awards nos anos de 2009/2010, hoje ela relembra literalmente toda sua trajetória nessa entrevista, em que além de contar abertamente os detalhes de sua primeira vez na televisão, também fala sobre pontos que marcaram sua história como o convite da The Walt Disney Animation para ser a voz da personagem Vanellope no sucesso “Detona Ralph”, que por sinal já está com continuação anunciada.

Como foi seu começo como blogueira?

Eu sou da época que literalmente era tudo mato, (risos)! Meu primeiro acesso à internet foi com BBS no meu colégio então fica difícil pra geração atual entender o que significava naquela época estar na internet. Só tinha blog (no início a gente chamava de pagina pessoal) quem manjava de programação, quem era muito do rolê geek e quem tinha grana pra ter um computador. No meu caso, meu pai comprava uns pra usar na empresa dele e os mais ultrapassados iam do escritório dele pro meu quarto. Quando eu aprendi html abri primeiro uns fansites (que hoje são os FCs) e depois meu próprio blog, na virada dos anos 90 pros 2000. A ideia na época era me conectar com pessoas que tinham a ver comigo, pq na vida real eu me sentia a única com estilo alternativo. A gente postava sobre nossas experiências, reflexões, filmes que víamos e havia uma pequena comunidade crescendo no Brasil. A Lia do Just Lia eu conheci nessa época! Eu também tinha dollmakers, só que o meu era da MariMoon mesmo, com as minhas roupas e meus cabelos tudo em pixelart feito por mim. A gente adorava fazer layout fofinhos e deixar presentinhos pras visitas (gifs animados, wallpapers, etc).

O que a levou a querer migrar da web para a televisão?

Não foi uma decisão minha, a Mtv me convidou porque queriam alguém da internet pra falar de internet (uma decisão sábia hahha). Eu topei na hora (como qualquer pessoa em sã consciência toparia), afinal era um programa diário só pra mim em rede nacional, pra eu falar sobre o que eu amava e ainda entrevistar um monte de gente legal.

Quando foi sua primeira experiência profissional como apresentadora?

Foi difícil porque eu não tinha experiência e na verdade sempre fui tímida. Tive que ser treinada e estudar bastante. Eu me sentia MUITO nervosa quando entrava ao vivo todo dia. Mas isso no primeiro ano. A partir do segundo foi aliviando a tensão, eu fui pegando o jeito, me sentindo mais confortável e no último ano já fazia tudo com a maior tranquilidade.

Foto: Ariel Martini

Como surgiu o convite de fazer parte do programa de Amaury Jr.?

Nos encontramos em NYC logo depois que a Mtv tinha acabado. A produção dele estava lá gravando e procuraram famosos brasileiros que moravam ou estavam por ali. Depois da entrevista o Amaury me elogiou aos montes, disse que me admirava demais como profissional e que eu deveria estar trabalhando. Me convidou pra ser reporter e disse que eu poderia escolher que tipo de pauta faria. Escolhi cobrir eventos culturais, os lançamentos de filmes, peças, livros e nessas tive a oportunidade de entrevistar Pelé, Ivete Sangalo entre outras celebs! Foi uma época muito gostosa e eu só tenho carinho por ele e pela equipe.

Como foi ser reconhecida pelo prêmio Capricho Awards duas vezes consecutivas em 2009 e 2010?

Na época que eu estava ali na Mtv as coisas tomaram proporções ainda maiores do que na minha época de fotologger / blogueira. Se antes eu já era influencer (antes de inventarem o termo), tinha minha própria marca, fãs, seguidores… depois que entrei pra Mtv e fui pro Acesso, aí multiplicou tudo. Nessa época eu mal conseguia andar em locais muito movimentados. Tive que parar de ir ao shopping pq fazia uma fila de gente pra tirar foto comigo. Eu achava muito gostoso (e ainda acho) todo esse carinho, foram muitos muitos muitos abraços. E o termo “influencer” ficou claro porque aquele jeito alternativo, que antes lá na época da escola eu tinha que vasculhar pra achar, de repente estava estampado nessa galera que vinha me falar como se inspirou em mim, como conheceu a banda X ou o cabelo colorido através de mim, como eu ajudei a sair do armário, a se aceitar, a se sentir melhor, etc etc. Isso é uma delícia. Um monte de pessoas como eu, que eu tanto procurei na adolescência, me acharam, se identificaram e botaram pra fora toda essencia que tava precisando sair. Se entender e se expressar é tão importante.

Sente saudade da época de apresentar o “Acesso MTV” junto com a Titi Müller?

Sinto bastante! Era uma rotina bem divertida com uma equipe que eu amava e amo demais. A gente nunca brigou, nunca teve problema. Era muita parceria, muita amizade, um monte de gente legal querendo fazer algo legal pros jovens. A Mtv Brasil foi uma das melhores coisas que existiu nesse país! Infelizmente parece que nunca os planetas vão se alinhar de novo do mesmo jeito, então só quem viveu sabe. Toda vez que reencontro algum colega daquela época chegamos sempre a mesma conclusão. Foi muito muito foda e o fim foi muito muito dolorido.

Foto: Wherb Rodrigues

Como foi sua estreia como atriz e o que despertou seu interesse pelas artes cênicas?

Eu fiz teatro qdo era adolescente pra aliviar minha timidez. Ajudou demais. E eu até que era boa, especialmente no improviso, que eu adorava. Mas qdo cheguei no último ano do curso, pra dar continuidade tinha q ser uma decisão de carreira pq a sequência já era profissionalizante. Eu tinha outros sonhos, apesar de estar na minha bucket list “fazer um musical”. Desde pequena AMAVA musicais! Tenho tios artistas do teatro e talvez seja metade culpa deles, metade da Disney. Em 2012 surgiu o convite pra fazer Fame, junto com Paloma Bernardes, Klebber Toledo, Giulia Nadruz e Murilo Armacollo. Foi difícil, porque mais uma vez eu estava fazendo algo que não sabia e isso me deixava bem nervosa. Mas eu não tinha solos. Só um pequeno solo de.. BATERIA! Sim, além de ter que cantar, dançar e atuar eu também tive que tocar bateria nessa peça. Hahahah! Foi incrível! Uma experiência que me rendeu mais auto confiança e muitos amigos!

Como foi dublar a Vanellope em “Detona Ralph”? Como surgiu o convite?

Foi outra coisa que estava na minha bucket list! “Dublar um personagem da Disney”. Eu sentia que isso ia acontecer algum dia e quando chegou o convite, quando eu descobri a história e conheci a Vanellope… cheguei a chorar de emoção. Meu avô trabalhava na Abril (tem até um livro sobre ele “o homem Abril”) e cuidou do licenciamento da Disney, então tinham muitaaaas coisas da Disney na biblioteca dele, incluindo uns livros incríveis que mostravam o processo todo de produção dos filmes. Meu sonho de criança era ser desenhista, mas acabei virando uma princesa da Disney!

Sobre apresentar a cobertura do Rock in Rio e do Lollapalooza na Globo, como é essa experiência toda dos festivais?

Muito bom estar em uma das maiores empresas de comunicação do mundo, falando de música, de festival, de bandas que eu adoro, podendo ser eu mesma e junto com uma equipe super profissional. Meus diretores são tudo de bom, pessoas que eu admiro demais e com quem tenho honra de trabalhar. Fazemos tudo de dentro do estudio no projac, então nem vamos realmente ao evento. Mas acompanhamos tudo pelas câmeras da Globo e da Globosat, separando o melhor pra nossa audiência conseguir ter uma noção de quão incríveis são estes festivais.

Foto: Wherb Rodrigues

Como é o seu envolvimento com a moda?

Quando eu era pequena minha avó costurava roupas e fantasias pra mim. Isso me inspirou muito para eu abrir minha própria loja online no início dos anos 2000 (antes de entrar na Mtv). Com ela eu rodei o Brasil em eventos de anime e nos Mercados Mundo Mix. Eu já era “influencer” e vendia tudo que tinha a ver com meu estilo: tinta de cabelo colorido, coturnos, saias plissadas, meias diferentes, coroas, casacos e toucas com orelhinhas de gato… Minha tia era figurinista de teatro e ela eventualmente me convidou pra trabalhar com ela em projetos muito legais de ballet e opera no teatro municipal. Através do seu visual nos expressamos a personalidade, e quando há segurança e auto confiança, descobrimos que podemos ser como quisermos, até um personagem de um filme do Tim Burton!

De onde surgiu o nome artístico “MariMoon”?

De um manga/anime chamado Sailor Moon que eu amava quando era mais nova. Passava aqui na extinta tv Manchete e depois na Cartoon Network. A Sailor Moon é uma garota fofa e engraçada que luta pelo amor e pela justiça. Ela é uma boa amiga, é sensível, chorona, romântica e que não desiste nunca apesar de ter muito medo.

Foto: Wherb Rodrigues

Considerada umas das primeiras digitais Influencers do Brasil, como vê a comparação da época do seu início com as webcelebridades de hoje em dia?

Acho que a principal diferença é que hoje as pessoas perderam a naturalidade pra “acertar”. Hoje pra garantir um bom engajamento do post no instagram se faz uma foto que destaque a pessoa do fundo, com boas tags, uma estética padronizada, precisa subir no melhor horário, etc etc. Na minha época tinha essa de postar às 19h pq se não o post não performa bem. Se eu postava às 15h ou às 20h, todo mundo que me seguia via meu post e pronto. Primeiro pq não existia algoritmo. Segundo que tinha menos contas pra seguir e portanto menos conteúdo pra ver. As pessoas passavam beeeeeem menos tempo na internet e a qualidade do conteúdo era bem menor. Não tinha essa nóis de concorrência, de números, de fazer collab só pra ganhar seguidor.. tudo era mais natural, vc fazia pq tava a fim quando estava a fim e do jeito que te dava na telha, sem medo de errar ou acertar. Engraçado que esse tipo de preocupação sempre foi da TV e era justamente isso que a Mtv não tinha em relação aos outros canais. A crítica que tanto se fez à televisão hoje pode ser feita a muitos canais/contas/perfis da internet. A preocupação com o ibope pra ter audiência a qualquer custo é um assunto complicado que merecia ser mais debatido.

Como foi comandar sozinha o programa “Scrap MTV”?

Muito tenso como eu já disse e também muito gostoso. Aprendi muito, conheci muita gente legal (incluindo idolos meus) e foi minha porta de entrada pra TV. Aprendi a apresentar ali. Mas não estava sozinha, estava com uma equipe maravilhosa que me deu muito suporte e me ensinou praticamente tudo que eu precisei pra me tornar a apresentadora que eu sou hoje.

De onde veio a ideia de criar o canal no YouTube?

Eu abri meu canal na verdade quando o YouTube surgiu beeeem no começo. Eu subia videos aleatórios, pq na época a gente pensava em ajudar o Youtube a ser um catálogo completo de todos os videos da internet (e eventualmente tomamos strikes pq os videos não eram nossos hahahha). Eu não via muito sentido em criar um programa pra mim ali se eu tinha um programa pra mim na Mtv. No Youtube vc faz tudo do seu jeito mas também investe muito tempo e, se quiser uma edição melhor ou uma camera e iluminação bacana, uma graninha. Eu preferi fazer um trabalho colaborativo usando a estrutura (e o dinheiro, rs)  da Mtv. Confesso que até hoje gosto mais de trabalhar assim. Prefiro ter um grupo onde todo mundo tem salário bem pago e direitos trabalhistas etc e a gente faz um conteúdo que passa coisas legais que nós acreditamos ser bacanas pra juventude.

Quais são suas inspirações como artista?

Tudo. A natureza. Todos os tipos de arte (música, dança, teatro, poesia, pinturas, esculturas…). Livros, especialmente os de não ficção que são meus favoritos. Pessoas e suas histórias. Lugares. Decoração. Conversas. Sonhos. A inspiração está o tempo todo ao nosso redor.

Deixe uma mensagem.

Todos somos influencers. Em maior ou menor escala, influenciamos pessoas ao nosso redor ou pessoas que chegam até nós pela internet. Pense que tipo de influência você está sendo todos os dias. Está inspirando essas pessoas positivamente? A serem pessoas melhores? A cuidar do meio ambiente? A cuidar de si mesmas? A cuidar das outras? Eu aprendi cedo que influenciava muito minhas irmãs pequenas e tentei dar o meu melhor. Depois descobri que tinha pessoas me acompanhando pela internet e tentei ser uma boa influência pra elas também. Até hoje tento passar coisas boas: inspirar amor e a amar, a valorizar a arte e cuidar da natureza. A apoiar projetos do bem, a fazer escolhas sustentáveis e pensar positivo. O melhor de tudo é que a maioria dessas pessoas são afetadas e influenciam por sua vez positivamente outras pessoas. Isso é uma cadeia do bem que a gente precisa usar a nosso favor se queremos viver num mundo melhor, com menos violência e mais amor.

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