Sócia e DJ da Festa Ploc, a maior festa retrô do Brasil, Pillar Gama, conhecida artisticamente como DJ Menina Veneno, não tem medo de se posicionar e mostrar seu valor em um cenário em que o sexo masculino ainda é predominante. Há 5 anos no mercado como DJ, a carioca de 33 anos luta diariamente para ganhar seu espaço.
O assédio também faz parte da rotina de Pillar. A empresária conta que por conta da exposição que seu trabalho a expõe, a imagem, o corpo, acabam sendo vistos como algo público, algo que se pode opinar e ter até um sentido sexual. Pillar descobriu sua vocação ainda na adolescência, aos 14 anos, quando pediu aos seus pais que montassem uma “boate” em algum ambiente de sua casa para receber seus amigos.
Trabalhando a cinco anos como DJ, poderia nos contar um pouco mais sobre como foi o seu início na profissão?
Começar a tocar comercialmente através da Ploc foi algo que se deu de forma bastante natural. Foi a união do “útil ao agradável”, estar mais próxima do Lu (DJ Dom LV, que, além de família, e um irmão, é alguém com quem aprendo muito, admiro, troco ideia com frequência e sou grata por todo carinho, força e oportunidade). Foi também expor publicamente algo que na boate lá de casa, desde os 16 anos, eu já fazia, estava familiarizada com praticamente todos os equipamentos, além dos anos de produção de shows e de festas.
Sabemos que quando tinha apenas 14 anos, você pediu aos seus pais para abrir sua própria boate, o que acabou gerando um enorme sucesso. Como foi o descobrimento dessa profissão e a aceitação do seus pais?
Foi a melhor fase da minha vida! Festeira nata, eu sempre curti receber os amigos em casa, e aos finais de semana não era diferente. A minha casa parecia um clube, ficava localizada na região dos Lagos, onde até hoje mora a minha mãe, ou seja…num paraíso, onde eu passava o ano e curtia as férias. Aos 14, os meus amigos, de 18, saíam para dançar, e eu não me sentia confortável em pedir para que eles se responsabilizassem pela minha entrada nos pubs da região, então decidi fazer os finais de semana lá em casa, que era onde eu me sentia segura, onde meus pais preferiam que eu estivesse aos 14, onde eu respondia por mim mesma.
Sempre fiz ballet, jazz e sapateado, e aos 5 anos tocava piano clássico. Era movida à música e sabendo disso, meus pais não hesitaram em montar uma boate no nosso quintal. Eu esperava por uma caixa de som e um pisca-pisca na varanda, mas de repente estavam fazendo obra, derrubando tudo e construindo uma boate com salão de jogos, garagem independente, passagem subterrânea para a piscina térmica, e os melhores equipamentos de São Paulo. Eu não esperava mesmo tudo aquilo, sempre achei meus pais exagerados, mas dessa vez eles tinham me surpreendido, porquê por mais que eu gostasse de reunir os amigos e de sair para dançar, eu nunca fui de pedir nada. Obviamente, eu me surpreendi, exceto por derrubarem uma árvore centenária que eu era apaixonada, nem sonhei em reclamar. A minha casa por anos funcionou como um “clube”, eu reunia turmas de amigos em todos os turnos do dia, os portões ficavam abertos o dia todo e a noite eu me certificava de que todos voltariam para a boate. De quinta à segunda, eu não gostava de ver a casa vazia. Com os melhores equipamentos e sets maravilhosos, dançávamos, jogávamos e intercalávamos com mergulhos na piscina a noite toda. Meus pais participavam da bagunça e isso nunca me intimidou, pelo contrário, eu amava quando eles se juntavam à turma e víamos o nascer do sol dessa forma praticamente todo fim de semana.
Qualquer boate da região perdia para a lá de casa. A noite poderia começar onde fosse, até tentávamos variar, mas de rodar quase toda a região, todos preferiam lá em casa. Os carros que passavam na rodovia viam as luzes da boate e durante a noite o nosso interfone não parava de tocar. A maioria dos carros que passavam em busca de diversão paravam para perguntar quanto era para entrar, se era aberta ao público e muitas vezes pediam para conhecer. Eu adorava! Para mim tudo era farra, queria mais é que entrassem e ficassem por lá com a gente. A maioria acabava virando amigo. Não encaro a discotecagem como uma profissão, mas como um complemento ao meu trabalho na Ploc. Faço por paixão e por diversão.
Atuando em uma profissão que muitas vezes é vista como masculina, como é representar o sexo feminino e lidar com esse preconceito? Qual seria o principal motivo dessas situações?
Representar o sexo feminino é indescritível, e acredito que assim seja em qualquer profissão. O preconceito existe em todos os níveis e profissões, escancarado, mas isso é algo que não me ofende por não partir de mim, e eu não me submeter a ele, sabendo me impor, e por ser motivo de pena a quem o cultiva e o dissemina. Eu o associo à extrema ignorância. No mais, tenho jogo de cintura, tiro de letra.
Sócia de uma das festas mais cobiçadas do Brasil, como foi a criação da Festa Ploc, e como funciona a produção dela nos dias atuais?
A Festa Ploc nasceu como uma festa de verão. Era para ter sido apenas uma edição e estreou no dia 7 de janeiro de 2004 no Espaço Marun, no Rio de Janeiro. Em poucos meses ela cresceu tanto que já estava sendo exportada para outros estados. Me lembro até hoje das reuniões de família em que falávamos aleatoriamente sobre o assunto, não imaginávamos o sucesso que estava por vir.
Sobre a produção, temos três formatos de festa: Formato “Pocket” (apenas com DJs), Formato com banda (DJ + Banda Ploc, a oficial da festa) e Formato “Full” (DJ + Banda Ploc + participação de artistas residentes, como Avellar Love, Silvinho Blau Blau, e Dr. Silvana). Entre outros artistas que participam frequentemente da festa, como as Paquitas, Gretchen, Rosana, Biafra, Felipe Dylon etc…
Tivemos que desmarcar inúmeros eventos nos últimos meses por conta da pandemia, de turnês internacionais, aniversários, shows nos outros estados, casamentos, eventos corporativos à festas Ploc Pocket semanais, que ocorrem todas as quintas há quase 4 anos, na nossa residência, que além de ser considerado o pub mais charmoso da Zona Sul do Rio de Janeiro – o Jungle Garden Pub, em Botafogo, ainda não tem previsão para voltar. A Ploc não é só uma festa, é uma produtora, uma grande marca, que apesar da festa ainda ser nosso “carro-chefe”, ela é mais um dos nossos produtos.
Em meados do ano passado decidimos colocar alguns projetos em prática e expandir a marca para diversos segmentos. Criamos o nosso canal no YouTube, a Ploc TV, temos a nossa cerveja artesanal, a “Ploc Beer”, e estamos trabalhando na nossa loja de produtos e vestuário retrô/vintage, a “Ploc Mundi”, com lançamento previsto para o verão de 2021, e claro que vocês terão acesso a todos os produtos e coleções da “Menina Veneno Store” (Um universo retrô à parte – só para mulheres!).
Referente as críticas, quais as dicas você teria para passar aquelas que ainda estejam começando ou passando por essa mesma situação?
Não costumo receber mais críticas do que elogios, e as que recebo são em caráter construtivo. Incentivo todas as mulheres a fazerem o que estiverem afim, e a dependerem menos da aprovação alheia. Seja o que for que que escolherem fazer, façam com paixão.
Para ser DJ, ao contrário do que muitos leigos pensam, não basta apenas saber mixar, apertar o play, aumentar e diminuir o volume … é preciso investir tempo e estudo para adquirir conhecimento artístico, técnico e desenvolver habilidades na área comercial, além de praticar a aprendizagem através da escuta. Um escritor de sucesso precisa ser inicialmente um grande leitor, um diretor de cinema, um grande cinéfilo, e um DJ, um grande ouvinte.
Certifique-se primeiramente do quão apaixonada por música você é, e do quanto está disposta a aprender. Sem paixão e garra, não há como progredir em NENHUMA carreira.
Apesar da implicação vim pelo sexo oposto, existem bons exemplos de DJs brasileiros que conseguiam mostrar respeito pelas mulheres na profissão?
Existem sim, e posso falar das pessoas que conheço: meu primo e todos os meus colegas DJs são pessoas extremamente respeitosas.
No modo geral, como você acredita que esteja sendo a evolução do sexo feminino no ambiente de trabalho?
Acredito que preconceito nenhum, atualmente, seja impedimento para o sucesso profissional quando se é alguém esforçado, íntegro e determinado, independente do sexo. As mulheres são a maioria, obtiveram muitas conquistas profissionais nas últimas décadas e só não avançarão mais se não quiserem. Porém, nós queremos e pretendemos dominar o mundo! (Risos), brincadeira, apesar do mundo já ser nosso, ainda temos muitas vitórias à conquistar, e conseguiremos porquê nós somos …”Fofas” (Risos).
Devido a exposição que a profissão a propõe, pela imagem e o corpo que acabam sendo vistos como algo público, o que você enxerga dessa questão? Já tiveram casos em que você foi desrespeitada nesse sentido?
Já passei por situações inconvenientes e não apenas no ambiente de trabalho. Na noite, qualquer pessoa está vulnerável, e como o DJ fica em evidência, acontece com ele também. Já vi muitas mulheres trêbadas e mal-educadas infernizarem a vida dos meus colegas DJs e de músicos de bandas que produzo e com quem convivo. Acontece também como muitos caras bêbados e sem senso de limite, que também me perturbam quando estou trabalhando, quando por acaso descobrem que no meio da noite “seca” (risos) dele, eu existo. Não acho anormal receber cantadas, pelo contrário, faz parte da exposição e muitas são inteligentes, bem-humoradas e vem de pessoas interessantes, mas a insistência é desrespeitosa e torna qualquer contato tóxico. Isso também me atrapalhar profissionalmente, então, isso eu não tolero. Eu peço moderação uma vez, às vezes duas, mas não costuma ter uma terceira. Eu tomo uma atitude contra esse tipo de situação sem me importar com o nível alcoólico ao qual o indivíduo se submeteu, porquê o álcool justifica mudança no comportamento até certo ponto. Até exageros e perdas de reflexos, mas não justifica desrespeito ou mau caratismo. Se está se sentindo bem o suficiente para me desrespeitar, que continue firme e forte para encarar as consequências.
Como a profissão de DJ é vista no Brasil hoje, e quais são as vocações que alguém da área precisa ter?
No Brasil, a profissão ainda não é regulamentada, mas está caminhando de ser, através da PLC 138/2018, aprovada no final do ano passado, sob análise da CAS (Senado). O item principal do projeto, reconhece como DJ profissional, quem tiver como comprovar na Subsecretaria Regional de Trabalho do seu Estado, cinco anos ou mais de exercício regular da profissão.
Quem ainda não tiver esse tempo de serviço, terá que passar por um curso específico, de nível médio, aprovado pelo MEC, para que possa exercer a profissão. A proposta também busca fixar limites de jornadas de trabalho, pagamentos de horas extras e resguardar os DJs nas relações com os contratantes, quanto a questões relativas a direitos autorais e a eventuais situações de assédio moral. Como profissão regulamentada, passará a haver também, o recolhimento de impostos.
Avalio que toda sociedade tende a ganhar com a regulamentação da profissão. A informalidade só gera insegurança, abusos e desvalorização. Conheço famílias que dependem do ofício do DJ para sobreviver. Torço pela regulamentação o quanto antes.
Quais são suas inspirações no meio da produção de eventos?
Não só nesse segmento busco crescer e me tornar uma grande empresária, tenho determinação, coragem e sonhos suficientes para isso.