Em Devaneios dos Amores Obcecados: Emoções que consomem a alma, o escritor e palestrante Vagner Faustino Fernandes revisita seus vínculos românticos mais marcantes para explorar, com sensibilidade e honestidade emocional, o impacto do amor na construção da identidade e na busca pelo equilíbrio entre afeto e individualidade. A obra, que parte da lembrança de um primeiro amor arrebatador e percorre uma trajetória de dor, amadurecimento e cura, convida o leitor a enxergar nas relações — mesmo nas mais desafiadoras — oportunidades de autoconhecimento e fortalecimento do amor-próprio.
Seu livro começa com a lembrança de um primeiro amor arrebatador. Como foi o processo de transformar uma memória tão íntima em literatura? Houve algum momento em que escrever doeu mais do que aliviou?
Foi um processo natural para mim transformar memórias em literatura, até mesmo porque, em relação às mulheres personagens da história, não as cito de forma pessoal (nominalmente), tendo esse cuidado de preservar o anonimato delas. O livro se divide em quatro partes: a primeira parte fala do primeiro amor não correspondido; a segunda parte aborda a namorada mais importante que eu tive; a terceira parte trata de um momento de reclusão emocional pós-término de namoro; e a quarta parte fala do segundo amor não correspondido. Para mim, a segunda parte do livro, referente à namorada, foi um processo de escrita bem desconfortável, não por lembrar dela em si, mas por estar totalmente relacionado às atitudes que os familiares (pai, mãe e tios dela) tinham comigo, que foram bem desagradáveis e repressoras.
A obra percorre uma jornada que vai da dor à reconstrução. Em que momento você percebeu que essas experiências amorosas poderiam, de fato, ser matéria de amadurecimento e cura não só para você, mas também para o leitor?
A partir do momento em que constatei que a escrita deste livro havia me curado dos meus fantasmas afetivos e emocionais, percebi que, se essa mesma escrita fosse objeto de leitura para outras pessoas, isso poderia ajudá-las em um processo de compreensão e aceitação de suas frustrações e desilusões para recomeçar os seus caminhos.
O título “Devaneios dos Amores Obcecados” sugere intensidade e, ao mesmo tempo, reflexão. Como você lida com essa dualidade entre paixão e lucidez nas suas relações e na sua escrita?
A intensidade das nossas vivências é um grande combustível para continuarmos vivendo, mas a lucidez é essencial para que não ultrapassemos nossos limites. Ela nos protege da carência afetiva e da dependência emocional. No meu livro, tento mostrar esse processo, onde a lucidez busca se sobrepor à escravidão movida por atitudes passionais. Por exemplo, na passagem que fala sobre o namoro, percebi que a falta de limites nas relações me privou de manter minha individualidade, o que exemplifica bem essa luta entre paixão e lucidez, refletindo os ‘devaneios’ que mencionei no título.
Você afirma que “o tempo é uma intervenção divina”. Em quais momentos da sua trajetória amorosa essa ‘intervenção’ mais te surpreendeu ou te transformou?
Quando chego à quarta parte do livro, um momento final significativo, percebo que finalmente amo uma pessoa que me faz bem e que provocou grandes mudanças em mim ao longo de quatro anos (de 2019 a 2023). Esse relacionamento me ensinou que a vida deve ser vivida de forma leve, dócil e serena. Essa fase específica da minha vida foi uma verdadeira intervenção do tempo, transformando minha visão sobre o amor e as relações.
Muito se fala sobre o amor-próprio, mas nem sempre é fácil reconhecê-lo depois de relações conturbadas. Que caminhos você encontrou para reconstruir sua individualidade sem perder a vontade de amar de novo?
Mesmo em meio a tanto sofrimento, quando você experimenta pela primeira vez o amor-próprio, isso traz uma sensação de completude tão grande por dentro de si que se torna natural amar alguém novamente, mesmo que você tenha se fechado para a vida e para a interação humana de uma forma geral por anos. Ao amar a si mesmo, temos a percepção exata de quando estamos amando alguém de verdade ou se isso não passa de um encantamento passageiro. O amor-próprio, no fundo, é toda a essência da individualidade, porque é pelo amor-próprio que percebemos que nós mesmos somos a nossa maior prioridade na vida.
Seu livro também pode ser visto como um espelho para leitores que já se sentiram emocionalmente consumidos por alguém. Que tipo de retorno ou identificação você tem recebido desde o lançamento?
Sim, com certeza absoluta, principalmente pela identificação que o público tem com a história do livro, como se, em palavras, pelo intermédio de frases e parágrafos sequenciais, eu transmitisse a eles o entendimento de suas próprias sensações dentro de variações de circunstâncias, ambientes e épocas distintas de suas vidas.
Você tem um histórico marcante de participação em eventos literários e prêmios importantes. Como esse reconhecimento impacta sua visão sobre a responsabilidade de escrever sobre temas tão sensíveis?
Participar de antologias e eventos literários, como as Bienais, me mostrou que há um grande interesse do público em temas de saúde emocional. Essa experiência reforçou minha responsabilidade em abordar essas questões em meus escritos de uma forma desatrelada da vertente da saúde mental. Por exemplo, ao receber feedback positivo de leitores em eventos, percebo a importância de discutir emoções e suas implicações. Acredito que, com o tempo, a resistência do mercado literário a temas psicoemocionais diminuirá, e essa é a motivação que me leva a continuar participando de premiações e eventos.
Se você pudesse deixar uma única frase como legado emocional do livro, algo que o leitor levasse consigo após a última página, qual seria?
Deixo como citação a frase do último parágrafo do capítulo “O Chamado”, que diz: “Você é o seu maior apoio; no entanto, se perder o ser eixo, poderá se tornar sua própria ruína.” O livro todo é sobre não perder o eixo e a fortaleza para alcançar isso; é solidificar o seu amor-próprio e, por consequência, sua individualidade.
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