Sérgio Coelho explora o surrealismo em 60 poemas instigantes publicados em novo livro

Luca Moreira
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Sérgio Coelho
Sérgio Coelho

Fantasmas, monstros, bailarinos e figuras mitológicas se encontram em um universo repleto de imaginação e mistério no livro A Garota e o Armagedom. Nesta coletânea de 60 poemas surrealistas, o escritor Sérgio Coelho leva o leitor a uma jornada pelos labirintos do inconsciente, explorando temas como amor, morte, amadurecimento e angústias humanas. Inspirado pelo movimento Surrealista, o autor combina mitologia, narrativas fantásticas e reflexões existenciais para criar uma obra que desafia a mente e emociona o coração.

Surrealismo é uma das grandes inspirações para “A Garota e o Armagedom”. Ao mergulhar nesse universo tão peculiar, como você acredita que o surrealismo pode ampliar nossa compreensão sobre temas tão profundos como o amor e a morte?

Ao tomar o Movimento Surrealista como inspiração para os textos do livro, não me preocupei em extrair do próprio movimento explicações prontas ou indicar caminhos a seguir. Cada um dos poemas, ou a maior parte deles, surgiu da minha própria vivência ou ideia a respeito dos temas. Além disso, cada poema resultou de um esforço criativo, do cuidado de não me tolher enquanto cada texto surgia.

As reflexões que acompanham ou acontecem em cada texto são feitas para que o próprio leitor as tome para si sem que isso aconteça de modo propriamente surrealista. Se a vida imita a arte ou se a arte incita a vida são questões que cada um deve entender por conta própria, mesmo que isso leve à tomada de consciência sobre o que é a vida.

Quando trago a inspiração surrealista para meus textos, faço-o por mera opção estética. Por outro lado, se os textos incitam o leitor, instigando reflexões, é porque foram criados também para isso.

O livro aborda uma vasta gama de cenários e personagens, desde uma jovem em busca de verdade até monstros e divindades. Como você escolheu esses elementos tão distintos para formar uma narrativa coesa, e qual deles mais ressoou com você durante o processo de criação?

Embora os poemas sejam distintos entre si e em quase sua totalidade apareçam no livro na ordem em que foram criados, quis propositadamente destacar a “saga” da menina que foge de casa e acaba envolvendo-se no Armagedon, uma batalha              que se daria em meio ao Apocalipse. Por mais estranho que pareça, isso não foi planejado, pelo menos não conscientemente. A ideia de um deus cantando em universos paralelos ocorreu-me ao assistir um show gravado em um museu. Enquanto assistia, veio o insight para o poema-título. Os seis poemas em seqüência que compõem a saga da garota trazem seres divinos, mitológicos, fazendo menção até ao folclore brasileiro. Com essa versatilidade, apostei numa estória envolvente.

Em “O Mudo e a Espada”, você utiliza a natureza como metáfora para a depressão. A escrita foi uma forma de lidar com essas inquietações pessoais, ou você vê sua obra mais como uma reflexão universal sobre esses temas?

Muitas vezes precisamos compreender o que nos falta para que possamos buscá-lo. Esse poema remete a situações vividas muitas vezes e das quais tive dificuldade de fugir por diversos motivos. Não sei o quanto é possível fazer diante desse poema, mas espero que muito saibam. Também tenho certeza de que muitos nem precisam lê-lo.

Nem sempre tive voz… por isso, o poema pode até ecoar naqueles que já se viram em situações angustiantes sem saber qual atitude tomar.

A protagonista de seu livro é uma jovem que se vê envolvida em uma trama apocalíptica, com figuras e divindades. O que você acredita que essa jornada representa no contexto da juventude de hoje, que enfrenta um mundo cheio de incertezas?

A jornada da personagem é a “jornada do herói”, tema conhecido entre escritores. Por outro lado, ao invés de precisarmos de um novo herói ou uma nova heroína, precisamos que cada um aprenda a resolver seus conflitos ou a se salvar das enrascadas nas quais se encontra. Para isso, sempre é necessário conhecer o próprio potencial, a fim de calcular os riscos que se enfrentará. Uma boa preparação é o que forma o grande protagonista.

Sérgio Coelho
Sérgio Coelho

Durante o processo de escrita, você mencionou que encontrou no Surrealismo um incentivo criativo. O que esse movimento, com sua ênfase no inconsciente e nos sonhos, trouxe de novo para sua visão literária e artística?

A inspiração no Movimento Surrealista veio a calhar, pois uma de suas orientações é a criação livre sem autocensura. Neste livro, escrevi em fluxo. Ao invés de idéias prontas, um verso surgia simplesmente porque o verso anterior estava pronto e eu precisava conseguir coerência entre eles, nas estrofes e no poema. Poucas vezes retoquei o texto antes de dá-lo como pronto. Isso me rendeu uma experiência inusitada, pois achei que não daria conta de terminar um dos poemas mais intrigantes do livro: “À Espera do Rei”.

“A Sentença de Morte” começa de forma fantasiosa e se transforma em uma reflexão sobre a transitoriedade da vida. Como você vê o papel da fantasia e da imaginação ao lidarmos com questões tão reais e existenciais, como o apego às coisas passageiras?

Vivemos em fantasia. Somos mortos-vivos, mumificados por crenças, valores, idéias, preferências, ilusões, apetites, etc. Por trás do apego há medo. Temos medo do que pode mudar e nos apegamos ao que temos e ao que somos, pois assim fica mais fácil não lembrar que tudo muda. Em “A Sentença de Morte”, faço trocadilho com a ideia de mumificação que temos hoje justamente por ignorarmos quase tudo ligado ao processo de mumificação das antigas civilizações.

A “múmia” é uma pessoa que passou pela vida sem conseguir dar a ela um propósito, um sentido, fazendo jus a “Sentença de Morte”, veredicto dado à alma que não conseguiu aprender a tempo o que fazer com a própria vida.

Você descreve o livro como um jogo criativo, envolvendo a mente do leitor. O que você espera que o leitor leve de mais importante dessa experiência literária tão imersiva e desafiadora?

O livro foi concebido para instigar o leitor a saborear cada poema calmamente, para que o sentido das palavras o surpreenda ao fim de cada verso.

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