O romance “Amarras do Destino”, da escritora baiana Mary Cristiane, mergulha o leitor em uma história de amor que transcende fronteiras culturais e desafia as amarras do passado. Quando Lunna, uma jovem branca criada em uma fazenda luxuosa, conhece Poti, um garoto indígena, durante um mergulho no rio, uma conexão profunda é estabelecida. O que começa como uma amizade logo se transforma em um amor intenso, mas ambos são confrontados com os padrões familiares do passado que moldam suas vidas no presente. À medida que Lunna desvenda segredos ancestrais de sua família, ela percebe que o destino deles está intrinsecamente ligado às escolhas feitas por seus antepassados. Com uma narrativa que mescla romance, tradição e autoconhecimento, “Amarras do Destino” convida os leitores a refletirem sobre a importância de quebrar padrões e construir um futuro baseado em escolhas conscientes.

Qual foi a inspiração por trás da criação da história de “Amarras do Destino” e dos personagens Lunna e Poti?

A criação veio como um brainstorm e sem mandar recado. Em uma viagem de férias estive em uma praia localizada ao lado de uma reserva indígena. Voltei para a casa de veraneio. Sentada, olhando para o mar, começou a vontade de escrever. Não parei durante todo o período. No restaurante, quando a inspiração vinha, eu escrevia no guardanapo para não esquecer nada. O nome dos personagens, a princípio, surgiram como base da história. Assim, os personagens foram criando corpo.

Como a sua formação em Psicologia e Direito influenciou a abordagem psicológica dos personagens e das dinâmicas familiares na narrativa?

A priori, o Direito teve um peso na composição da mediação dos conflitos. Já a Psicologia, foi abordada numa forma mais lúdica de lidar com a iniciação (rito de passagem dos jovens), as frustações, as emoções, as diferenças, preconceitos entre outros.

Em “Amarras do Destino”, os personagens enfrentam desafios relacionados à quebra de padrões familiares. Como você aborda essa questão na história e qual mensagem deseja transmitir aos leitores?

Somos seres que vivemos em grupo e sentimos pertencentes a ele. No entanto, se há uma mínima possibilidade de rompimento desse vínculo, tendemos a reagirmos para manter o padrão. Gostamos do novo, porém ele nos assusta, acabamos repaginando o velho com receio do novo, “um novo do mesmo”. Isso acontece nas relações humanas: um novo membro de um certo grupo chega, essa pessoa ainda não é conhecida, então, ela precisa passar pelo crivo dos mais antigos. Isso se estende no trabalho, na escola, comunidades religiosas etc. No livro, isso começa de mansinho, com pequenas porções de reflexões a respeito das diferenças culturais. À visão da inocência dos personagens, nos remetemos a nós mesmos quando éramos crianças, sem julgamento ou indiferenças. Com o passar do tempo, eles terão que lidar com a vida real no mundo dos adultos, ambos passam por provas de iniciação, as quais irão fortalecê-los para lidarem com os conflitos futuros de preconceitos e discriminação.

O romance entre Lunna e Poti transcende as diferenças culturais e as amarras do passado. Como você desenvolveu esse relacionamento e o que ele representa para os personagens?

Foi surgindo aos poucos. Minha intenção é que o leitor compreenda alguns aspectos inerentes a vontade do indivíduo no seu destino. A não ser que ele esteja consciente, para não repetir e sair fora do emaranhamento do clã. Vivemos em uma sociedade que não muito distante um sujeito só podia se relacionar com seus iguais, bem como casar ou fazer negócios. Atualmente, as diferenças continuam. A concepção de julgamento e preconceito, muitas vezes velada, se disfarça. No livro, abordo de forma mais exposta o ponto de vista de cada clã, isso quer dizer, o certo ou errado, mas com outra perspectiva a partir da troca das lentes. Somente com o confronto despertamos, e, cada Clã tem uma história de sofrimento, uma trajetória.

O livro aborda temas como amadurecimento, superação de obstáculos e a busca pela verdade. Como esses temas se entrelaçam na história e qual é a mensagem central que você deseja transmitir aos leitores?

A verdade vos libertará, contudo, a dor é pedagógica. O amadurecimento não é uma questão biológica, mas sim de decisão. Para superarmos a adversidade, superar obstáculos, a verdade a respeito de como transitar no processo nos ajudará a fortalecer e atravessar nossa própria floresta. A travessia requer determinação e força para nos mantermos firmes na jornada. As vezes a forma lúdica nos ajuda a perceber com outros olhos esse processo de amadurecimento, principalmente na iniciação de um jovem para entrar na vida adulta. No livro esse processo acontece paulatinamente.

Mary Cristiane

Qual foi o maior desafio que enfrentou ao escrever “Amarras do Destino” e como o superou?

Atravessar a minha própria floresta, acreditando que terminar o livro era um processo que dependia somente de mim. Fazer isso mesmo ouvindo que “ninguém ganha dinheiro com livro”, “é muito difícil entrar nesse mundo”, e meu lado sabotador dizer que eu não era boa o suficiente, que minha história não era atraente, entre outros. Primeiro, assisti um vídeo da Lilian Cardoso. Em seguida, apostei no curso Escritores Admiráveis. Hoje estou aqui.

Você mencionou que este é o primeiro volume de uma duologia. O que os leitores podem esperar do próximo livro e como ele se conecta à história de Lunna e Poti?

Ambos os personagens nos representam de alguma forma ou alguém que conhecemos, buscam um lugar ao sol. Com isso, eles aprenderam alguns princípios e valores fundamentais para alcançar a plenitude na vida adulta, sem desonrar os entes queridos, mesmo não concordando com moduladores de crenças e julgamentos. Usam a confrontação moral para “cair na real”. É muito lindo ver que os personagens foram criando estatura de governo interno para se impor no mundo externo. A proposta é trabalhar mais com a jornada interna dos personagens.

Como foi o processo de pesquisa para retratar as tradições indígenas presentes na história? Você teve alguma experiência pessoal que influenciou a representação dessas culturas?

Eu venho de uma raiz ancestral indígena cujo cotidiano não tive acesso. Na minha infância, na cidade em que vivi, tive acesso à cultura e sempre gostei de comprar os acessórios e instrumentos dos indígenas que vendiam esses objetos para se alimentar. Hoje entendo melhor o que acontecia e compreendo que alguns relatos eram tristes. Pesquisei algumas tradições de iniciação dos jovens, tanto nas comunidades do Brasil quanto do exterior, para dar mais emoção no personagem.

Além de advogada e psicóloga, você também tem experiência em Justiça Restaurativa. De que forma essa experiência influenciou a construção de conflitos e resoluções na trama?

A formação de facilitadora da Justiça Restaurativa e especialização Psicologia Jurídica de Mediação de conflitos foram um divisor de águas a respeito de manter uma comunicação não violenta (CNV) desenvolvida por Marshall Rosenberg e uma escuta ativa, para saber ouvir as necessidades do outro. Desta forma, os protagonistas serão pivô da possível aliança de uma ruptura que perdura há gerações.

Qual conselho você daria para aspirantes a escritores que desejam transformar suas ideias em livros publicados?

Se aconselhar com profissionais que tenham experiência na área. Estas pessoas poderão orientá-los quais os melhores caminhos a serem seguidos. Os obstáculos não podem ser sanados 100%, uma vez que somos seres em construção, mas, com certeza, serão minimizados. O Grupo LC me ajudou em todos os passos até agora. Pretendo levar essa parceria por todo meu percurso como escritora.

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