Em “Toda Vez Que Eu Me Apaixono”, a escritora Lari Volf apresenta a história de Ágata Mendonça, uma jovem marcada por uma maldição geracional que a impede de acreditar no amor verdadeiro. Com uma trama que mistura humor, dilemas familiares e questões sobre destino e livre-arbítrio, Volf convida os leitores a se aprofundarem nas escolhas de Ágata, suas cicatrizes emocionais e sua busca por um amor que desafie as expectativas e medos que a cercam. O romance, inspirado por poetas como Rupi Kaur e autores como John Green, oferece uma reflexão sobre os recomeços e o universal sentimento do amor, além de tratar de temas como não-monogamia, abandono e a pressão social em busca da felicidade.
Há dores que parecem atravessar gerações, e o amor, às vezes, carrega mais cicatrizes do que promessas. Como foi, para você, dar voz a uma personagem como Ágata, que acredita viver sob uma maldição afetiva? Houve algum momento em que se sentiu especialmente conectada à sua dor?
Dar voz à Ágata foi um processo desafiador, mas satisfatório. Foram camadas e mais camadas de dúvidas existenciais e busca por sentido, que a afundavam cada vez mais em suas crenças. Ágata não prejudica os outros, ela prejudica a si mesma, e isso não é tão fácil assim para ela perceber. Quase ao final do livro existe uma cena que fala mais especificamente sobre o destino, e é uma das cenas mais bonitas e também mais reflexivas, na qual Ágata reflete sobre o peso das escolhas e também sobre o peso de não escolher. Nesta cena, ela fala sobre uma espécie de efeito borboleta que está presente na vida de todos nós, e sobre como alguns poucos segundos podem nos direcionar para um caminho totalmente diferente. Com certeza, este foi o momento em que mais a vi como humana, pois todos temos “e se?” igualmente importantes rondando nossas mentes.
O “Lost Pub” é mais do que um cenário: ele se transforma em um espaço de escuta, conselhos e revelações. Você se inspirou em algum lugar real ou simbólico para criar esse ambiente tão significativo na história?
A criação do “Lost Pub” foi uma consequência da construção do personagem Nelson. Ágata precisava ser ouvida, mas não podia conversar com ninguém que conhecia, nem procurar alguém em um ambiente em que já estivera antes. Não foi uma escolha ir até o “Lost Pub”; ela apenas se encontrava em um estado de exaustão mental tão grande que entrou lá sem pensar muito — e foi o que a salvou. Nelson Davi Folle foi inspirado em dois psicólogos que tive durante a pré-adolescência: Davi André Martins Claro, que faleceu em 2015, e Nelson Conrado, que faleceu em 2014. Uma das conversas mais significativas que tive com Nelson foi quando usei uma frase pronta que dizia “Se você tiver 1% de chance, tenha 99% de fé”, e ele me respondeu com “Você tem 99% de chance, e tem 99% de fé”. Construir um personagem no livro inspirado nessas duas pessoas importantes que passaram pela minha vida foi a forma que encontrei de honrar toda a ajuda que recebi.
Entre capítulos e mensagens trocadas, a narrativa ganha ritmo de vida real — como se estivéssemos lendo o diário de alguém que amamos. Como foi o processo de construir uma história tão íntima e fluida, e por que escolheu a primeira pessoa como ponto de vista?
Toda Vez Que Eu Me Apaixono nasceu como se fosse mesmo um diário, e fui mudando a estrutura narrativa com o passar do tempo. Escrever em primeira pessoa foi necessário para que o leitor soubesse o que se passava na cabeça de Ágata, mas também — e principalmente — para que não soubesse o que se passava na cabeça dos rapazes. Eu queria que as mesmas dúvidas de Ágata fossem as dúvidas do leitor e que, nesse processo de busca por respostas, o leitor pudesse, junto com a protagonista, questionar suas crenças e descobrir coisas importantes sobre si mesmo e sobre os outros.

Rupi Kaur e John Green são nomes que, como você, falam de amores intensos, frágeis e transformadores. De que forma essas referências influenciaram a alma do livro? Há alguma cena que, ao escrever, você sentiu que traduziu essa inspiração de forma especial?
Acredito que os livros de Rupi Kaur e John Green me moldaram como pessoa, e que a escritora que habita em mim, com essa inspiração já enraizada no peito, apenas deixou que uma letra seguisse a outra e o processo acontecesse quase que de forma inconsciente. Mas, falando de John Green e, especialmente, de “Quem é Você, Alasca?”, essa é minha protagonista preferida da vida, e as duas poderiam facilmente ser irmãs — não fosse a questão paterna de Ágata e a questão materna de Alasca. Ambas carregam o desejo de mudar o mundo junto com a vontade de desistir no primeiro problema. Vejo em Ágata e Alasca a mesma coragem e a mesma qualidade admirável: seguir em frente, mesmo com o coração aos pedaços. Mas até mesmo o ímpeto precisa ser prudente.
Toda Vez Que Eu Me Apaixono também fala de recomeços — não só no amor, mas nas relações familiares e nas escolhas de vida. O que você aprendeu sobre recomeçar enquanto escrevia esse romance?
Sempre há tempo para recomeçar. Volto a falar sobre o efeito borboleta, e digo mais: mesmo quando acreditamos que tudo acabou, que não há mais chance ou que já perdemos muito tempo, sempre podemos repensar e fazer outras escolhas. Decisões que tomamos em segundos podem alterar todo o curso do nosso destino e nos levar a lugares que nem imaginávamos ser possível. Relacionamentos podem ser restaurados, amores antigos podem ser reencontrados, famílias podem ser recompostas. Nunca é tarde para tentar de novo — mas é preciso decidir o que realmente queremos e caminhar em busca daquilo que nos faz feliz.
A não-monogamia e o “destino versus livre-arbítrio” são temas delicados, mas tratados com naturalidade ao longo do livro. Como foi incluir essas reflexões no enredo sem perder o tom leve e dinâmico da narrativa?
“Não-monogamia” é o rótulo que colocamos para o envolvimento emocional com mais de uma pessoa, mas dificilmente colocamos o rótulo de “monogâmico” em um casal. Longe de querer impor determinada visão sobre outra, o livro apenas levanta essas questões para que possamos refletir. Ágata não se define como “não-monogâmica”, ela apenas ama mais de uma pessoa ao mesmo tempo e com tudo o que pode. No mundo em que vivemos, com tanto ódio e rancor, amar alguém deveria ser encarado como um ato de coragem. Do mesmo modo, questionar as nossas crenças também deveria ser algo natural, uma vez que, se não houvesse a dúvida, não faria sentido existir a fé.
Você construiu uma protagonista que vive entre o medo e a esperança, e muitos leitores jovens se verão nela. Como você lida com essa responsabilidade de tocar assuntos tão emocionais e reais para quem está lendo?
Entendo que a mensagem principal do Toda Vez Que Eu Me Apaixono é o amor — e que o mundo precisa muito do amor. Todas as questões que Ágata enfrenta no livro com relação às suas crenças, à sua família e aos seus sentimentos conflitantes, sempre têm o objetivo de fazer com que ela e o leitor se questionem. Não há nenhuma resposta pronta, apenas perguntas para que possamos refletir e nos tornar pessoas melhores, mais empáticas e conscientes de nossas escolhas. E, no final de tudo isso, que possamos amar mais — tanto as pessoas ao nosso redor, quanto a nós mesmos.
Para além dos livros, sua atuação como educadora e agente cultural mostra um compromisso com a literatura que ultrapassa o papel. De que forma sua vivência com o público e com a cultura local influencia sua escrita e os temas que escolhe abordar?
Acredito que minha escrita influencia minha atuação no contexto local, mais do que o oposto. Nasci em um ambiente cercado de histórias, com livros, filmes, séries e músicas, onde todas as minhas escolhas convergiam para o mesmo sentimento: o amor. Eu escrevo sobre o amor, e é isso que procuro transmitir em minhas ações culturais: o amor próprio, o amor romântico, o amor familiar, o amor entre amigos, o amor pelos animais, o amor pela vida e pela natureza. Um sentimento puro, altruísta, generoso, que deseja o bem de todos e que procura fazer do mundo um lugar melhor para se viver. Eu levo o amor, e o amor sempre volta para mim.
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