“Coisa Nossa”, o álbum de estreia da dupla João Mantuano e RAYA, chegou no dia 6 de dezembro pelo selo Toca Discos. Mais do que um título, o nome reflete a essência do projeto: a intimidade das composições criadas a dois e a vastidão das referências que atravessam fronteiras musicais, mesclando brasilidade e influências internacionais. Com 11 faixas, o disco combina violões intimistas, arranjos cuidadosos e uma sonoridade que dialoga com nomes como Novos Baianos e Simon & Garfunkel, marcando o início de uma parceria que já rendeu cerca de 40 canções.
O álbum “Coisa Nossa” nasceu de um encontro casual que rapidamente se transformou em algo muito maior. Como vocês descreveriam o momento em que perceberam que não estavam apenas criando um single, mas construindo uma parceria artística duradoura?
Nós dois, com nossas carreiras solos, já éramos do selo Toca Discos. Felipe Rodarte sugeriu que nos encontrássemos para fazer uma canção juntos, com a intenção de iniciar um movimento onde a nova cena da música pudesse estar trocando mais. A partir disso nos encontramos e fizemos uma primeira música. Gostamos tanto do resultado que nos propusemos a mais, já que ambos têm esse prazer enorme na parte da criação. Quando vimos, já tínhamos um bocado de músicas. Mostramos esse compilado para o Felipe e pra Constança que se surpreenderam e nos surpreenderam também quando disseram que o que tínhamos na verdade era um projeto e um disco. A gente foi levando a troca de maneira tão despretensiosa que talvez só tenhamos nos dado conta nesse momento mesmo. Acho que isso colaborou também para que a coisa fluísse sem pressão, sem cobrança, só com a parte positiva que uma criação pode ter. Hoje já temos em torno de umas 40 canções compostas juntos.
A ideia de “Coisa Nossa” reflete tanto a intimidade da criação quanto o vasto território cultural brasileiro. Como foi o processo de equilibrar essas dimensões em um único projeto?
A gente gosta muito da simbologia desses dois significados. A intimidade da criação tem a ver com o nosso processo, nosso encontro, a construção dele. Essa coisa de uma relação entre duas pessoas – qualquer que seja ela – que somente essas duas pessoas têm a dimensão e o acesso. O outro significado tem a ver com a pesquisa que a gente se propôs a fazer em relação à música popular brasileira, à música de raiz, misturando referências que temos em comum do passado para construir um futuro e, consequentemente, a identidade e autenticidade do nosso projeto. Acho que o primeiro significado se aprofunda dentro de quem somos. Mergulha na nossa intimidade. Já o segundo, mostra o porquê de estarmos juntos, onde queremos estar. Mas ambas dizem um tanto de onde viemos. E a gente quis trazer para a margem esses dois significados.

Vocês exploraram sonoridades variadas no álbum, como a brasilidade dos Novos Baianos e elementos do folk americano. Qual foi o maior desafio em incorporar essas influências tão distintas sem perder a essência de vocês?
Buscamos o que há em comum nas duas linguagens. De toda forma a linguagem popular conversa entre si e os assuntos e jogos de palavra e poesia não são tão diferentes, a música é harmônica em sua natureza. A mistura é o próprio DNA da música popular brasileira. Não era nada muito distante da gente.
A decisão de afinar os instrumentos em 432 Hz para criar uma experiência mais harmônica é fascinante. De que maneira essa escolha impactou o processo criativo e a conexão emocional com as músicas?
A afinação 432 é um pouco mais baixa que a convencional, o que alivia expectativas de tensões. A intenção é nos proporcionar uma percepção mais contemplativa das canções, evitando o caos envolto.

As letras do álbum parecem carregar uma forte ligação com a natureza e temas como liberdade e contemplação. O que inspirou vocês a trazerem essas imagens e mensagens para as canções?
Procuramos a profundidade poética e ainda simples, popular; acreditamos que a profundidade está nas dúvidas inevitáveis, nas fatalidades. A gente acredita que esses são temas comuns a todo mundo, ou ao menos a quem está aberto para o sentir, ainda que o mundo nos deixe anestesiado para tanta coisa atualmente. É pela possibilidade de se emocionar com uma vista, com a lua, com o pôr do sol. Trazer para margem as emoções mais puras e complexas. A realidade é um grande espetáculo.
Em “Coisa Nossa”, há canções que vocês interpretam sozinhos, como “Arrebol” e “Rouxinol”. Como vocês decidiram quais histórias e sentimentos seriam expressos individualmente e quais seriam contados em conjunto?
Acho que essa escolha se deu de forma natural e espontânea. Não sei se houve um momento exato em que a gente definiu o que seria feito por quem. Tanto que as duas canções foram feitas por nós. Mas acho que no final das contas a intuição tem alguma razão inconsciente porque elas refletem bastante a nossa individualidade. Ambas têm muita contemplação, coisa que temos em comum, puxam bastante para o folk, mas achamos que energeticamente uma se conecta mais com um do que com o outro.

Com tantas colaborações incríveis no álbum, desde produtores até músicos talentosos, cada encontro parece ter adicionado algo único ao projeto. Qual momento ou colaboração mais surpreendeu vocês durante a produção do disco?
Dá para apontar três momentos emblemáticos nesse processo. Ter o Marcos Suzano gravando com a gente foi um presente. Além dele ser um cara muito alto astral, ele trouxe uma camada percussiva de muita personalidade, que trouxe uma cara para o projeto que a gente ainda não tinha conseguido visualizar. O segundo momento foi ter vivido a experiência com Renato Cipriano, no estúdio dele em BH, onde a gente pode entender um pouco mais sobre o estudo dele sobre as frequências e experimentar isso no corpo. E o terceiro momento foi receber o disco mixado pelo Alvaro Alencar. Isso foi muito impactante porque acho que nunca havíamos escutado um resultado sonoro tão impressionante como o que ele fez.
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