Flávia Hartmann revive anos de chumbo no livro “O General Estava Nú”

Luca Moreira
7 Min Read
Flávia Hartmann (Foto: Divulgação)

Uma história de leitura fácil, porém marcante, traduzindo o estilo da autora que ultrapassa fronteiras por boas histórias, nos formatos impresso e e-book. Desde a primeira frase de “O General Estava Nú”, a escritora Flávia Hartmann revela o feio e bonito, o lado bom e o mau de cada personagem, deixando claras as suas personalidades. Sua escrita provoca e captura desde o início, deixando ao final lembranças de uma época real, de horrores sofridos, mas também da realidade de pessoas que lutavam por suas humanidades e por desnudar aquilo que o general representava.

O cenário é o Rio de Janeiro. A época, os anos de chumbo. Nesse contexto, uma família de classe social elevada vivencia seus pequenos dramas cotidianos permeados por um clima de violência que se revela de inúmeras formas. Uma história de vítimas e algozes, em que personagens frágeis em estado de extremo sofrimento podem se transformar em predadores ou vítimas silenciosas. Em O General estava nu a autora, sem emitir juízo de valor, desnuda fatos que a sociedade busca ocultar, por vergonha, por medo, ou por convicção, assim como a natureza secreta de cada pessoa que, olhando de fora, é diferente do que imaginamos. Mas não é só isso. A narrativa, leve em sua maioria, nos instiga a conhecer o cotidiano, os desejos, a trajetória dos personagens, cujas histórias de vida se compõem de uma riqueza, traduzida nos detalhes minuciosos que nos são apresentados.

O romance de Flávia Hartmann retoma este momento passado e tão presente da influência militar ditando a vida civil. Para tanto, conta a história de uma presença militar familiar. O familiar indesejado por todos nós, que desorganiza os laços fraternos e altera caminhos. O General Estava Nu, não deixa de ser uma metáfora do que conhecemos. E traz um final alucinado e catártico que desejamos. Confira a entrevista!

Lançado recentemente, a sua obra “O General Estava Nú”, ao mesmo tempo em que propõe uma leitura dinâmica, acaba apresentando ao público uma reletiura dos anos de chumbo através de diversas humanidades diferentes. Como surgiu a ideia do livro inicialmente?

Durante a pandemia do COVID me surpreenderam os movimentos negacionistas tanto em relação às vacinas quanto à existência da ditadura no Brasil. A ideia nasceu deste incômodo.

Na apresentação do seu livro, você demonstra o seu estilo próprio de escrita, assim como todo autor. No caso, como definiria o seu formato de escrita e até onde é capaz de ir para conseguir contar boas histórias?

Estou começando na literatura. Escrevi como eu penso, com muitos detalhes e personagens. Foi um desafio pessoal. O segundo romance está indo com esta mesma proposta. Acredito que sou capaz de ir bem longe para contar minhas histórias.

Fazendo uma alusão ao Edifício Dakota, o livro desde o início define a ambientação do Edifício Seabra como feio e bonito ao mesmo tempo. Como foi trabalhar com essa questão das duplas características no livro?

Durante a escrita do O General estava Nu, trabalhei as dualidades:  claro x escuro, bom x mau, luz x sombra, por exemplo. Para mim não existe só um lado.

Flávia Hartmann (Foto: Divulgação)

A obra ela acaba por relatar uma época cinza, onde muitas pessoas passaram por sofrimentos e luta pela humanidade e por desnuar a representatividade do general. Escrever sobre uma época delicada como foi essa requer um cuidado maior com a veracidade?

Sim, não poderia errar nas datas, nos fatos reais. Demandou pesquisas, leituras e muita revisão. Valeu a pena.

A história roda em torno de uma família de classe alta que vivenciam seus problemas em um clima de violência da época. Como se deu o processo de construção desses personagens?

Eles acabaram falando por si. Como se eu dessa voz a estas pessoas. Teve uma noite que acordei com a sensação do General sentado na minha cama, dizendo que queria falar. Fui para o computador e ele contou a parte dele. Senti-me no final do processo, uma boa ouvinte.

Flávia Hartmann (Foto: Divulgação)

Um dos grandes potenciais da literatura é justamente o de conseguir transportar seus leitores à outros mundos através da imaginação e interpretação. No caso da experiência de escrever um livro como esse você chegou a imaginar como seria viver nos anos de chumbo?

Eu vivi este tempo. Sou de 1956 e sei o quanto isto foi verdadeiro, duro e inadmissível. Pedirem para reviverem este período foge ao meu entendimento. Escrevi este livro para dizer que basta a gente não vai permitir mais a Ditadura no Brasil.

Atualmente o livro já está disponível em formato impresso e em e-book nas lojas. Como tem sido ver a recepção do público e quais as suas dicas para que os leitores consigam interpretar a mensagem que quis passar na obra?

Até agora, só duas pessoas verbalizaram um desconforto em relação a ele: uma por posição política e outra por se identificar com a personagem Tereza Cristina. A maioria lê de uma sentada. Sugiro ler sem grande expectativa e com a mente aberta. Atenção se faz necessária, já que estamos falando de muitos personagens. Principalmente que acreditem que apesar de ser uma história de ficção, trata-se de um tempo recente de nossa história que foi vergonhoso e não precisamos mais dele.

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