Clara Haddad, a renomada contadora de histórias luso-brasileira, que é amplamente admirada tanto no Brasil quanto em Portugal, comemora seus 25 anos como artista da palavra. No próximo dia 25 de novembro, o Memorial da América Latina se transformará no palco especial dessa celebração, marcando duas décadas e meia de dedicação de Clara Haddad à arte da narração.

O programa para esse dia memorável incluirá a participação de Lenice Gomes, Jonas Ribeiro e Cidinha Pardini, bem como várias intervenções de narradores e artistas de diferentes partes do mundo, que compartilharão suas experiências por meio de um telão, prestando homenagem à contribuição única de Clara Haddad para a narrativa oral e estabelecendo uma conexão especial entre o Brasil e Portugal.

Entre suas notáveis realizações, destaca-se a fundação da “Escola de Narração Itinerante”, em Portugal, em 2006, onde transmitiu a arte da palavra para inúmeras pessoas que hoje contam histórias profissionalmente. Em 2015, foi reconhecida como a melhor narradora de língua portuguesa na Europa. Além disso, em 2020, foi agraciada com o Troféu Baobá, conhecido como o “Óscar dos Narradores e Mediadores de Leitura” no Brasil, em reconhecimento ao seu percurso exemplar. Outro ponto alto deste evento será o lançamento do livro “A Vehinha e o Porco”, escrito por Clara Haddad e publicado em inglês e português pela Telos Editora. O livro apresenta ilustrações do artista colombiano Canizales.

Para encerrar esta celebração com chave de ouro, Clara Haddad encantará o público com um espetáculo especial, compartilhando suas histórias fascinantes e acompanhada pelo talentoso músico Ramiro Marques. Esta apresentação promete ser um momento de pura magia, capaz de cativar a todos os presentes. Este evento é uma homenagem merecida a uma artista que dedicou sua vida à promoção da narrativa oral e à difusão das riquezas culturais do mundo, especialmente da cultura luso-brasileira, através das histórias que partilha.

Como começou sua jornada na narração oral, e o que a motivou a escolher esse caminho artístico?

Comecei em 1998 numa decisão de fim de ano. Tenho formação em Artes Cênicas e TV e Cinema, mas sentia que precisava dar uma virada na carreira fazendo algo que me conectasse de uma forma mais próxima com o público.  Me voltei aos contos que ouvia na infância através da voz da minha avó. Foi uma transição difícil, pois são artes semelhantes, mas senti que fazia mais sentido, queria trabalhar a arte de uma maneira mais orgânica. O que me encanta na linguagem da narração de histórias é o narrador ter a possibilidade de fazer todas os personagens, sem deixar de ser ele relatando os acontecimentos. Podemos mudar a voz e até o gesto, mas não deixamos de ser nós mesmos ao narrar uma história. Já na arte do teatro trocamos de pele e criamos uma vida que não é a nossa e a contamos pelo olhar da personagem.

Ao fundar a Escola de Narração Itinerante em Portugal, qual foi a visão por trás desse projeto e como ele impactou a disseminação da arte da narração na região?

Queria oferecer a oportunidade de variedade de vozes de narradores ao público português. A ideia da escola de narração era dar espaço para criar e ouvir histórias. Um espaço de estudo sério e comprometido com a ética na profissão, com a multiplicidade de estilos possíveis para narrar. Quando cheguei em Portugal, em 2005, havia um movimento pequeno de narradores e era centrado em 3 ou 4 artistas e um festival. E, após o surgimento da escola narração itinerante, em 2006, os eventos que organizei, sobretudo, no norte do país, como noite de contos para adultos, maratonas de contadores em diversos espaços e livrarias e festivais houve aumento significativo do público ouvinte desta arte e consequentemente de pessoas que passaram a se interessar pela profissão passando a estudar e conhecer mais sobre o assunto e posteriormente dando o passo para se profissionalizar. Sei da importância disso e me alegro com a trajetória das pessoas que se tornaram colegas de trabalho e circulam por Portugal em vários eventos e até em outros países. Ensinar esta arte é também dar espaço para o novo. Acredito que este é o caminho. Abrir portas e não criar muros.

Receber o título de melhor narradora de língua portuguesa na Europa em 2015 deve ter sido uma honra significativa. Pode compartilhar um pouco sobre esse reconhecimento e sua importância para você?

Reconhecimento sempre é bom, mas não é o que me move. Não narro pelos prémios ou para ter títulos. Narro histórias porque amo fazer isso é me sinto absolutamente entregue ao momento da narrativa. E como o ar que respiro e minha maneira de ser tudo na vida. Acredito que é uma função social, de disseminar a cultura e arte de vários povos através das palavras para que este conhecimento não se perca. Eu quando recebi o prêmio na Bélgica, nem estava à espera dele e nem sabia que concorria. Soube pelo público no final do meu espetáculo que tinha sido escolhida. Ao saber da notícia, claro que me enchi de alegria e me senti muito honrada de representar os artistas de língua portuguesa. Sem dúvida, foi um momento ímpar na minha trajetória.

O que significa para você receber o Troféu Baobá em 2020, conhecido como o “Óscar dos Narradores e Mediadores de Leitura”?

Ser homenageada pela minha trajetória, por levar o nome do Brasil ao mundo e fazer o intercâmbio de cultura com Portugal e outros países é um reconhecimento muito importante e significativo para mim. Sobretudo, por estar ao lado de pessoas que admiro e que também foram reconhecidas por este troféu. Isso me dá a certeza de que estou no caminho certo.

Seu novo livro “A Vehinha e o Porco” promete ser uma obra encantadora. Pode nos contar um pouco sobre a inspiração por trás deste livro e o que os leitores podem esperar?

Esse é um reconto de uma história tradicional inglesa que ouvia na infância. Eu adorava a “velhinha”, mas sempre quis fazer a minha própria versão. E agora, depois de tanto tempo com esta história na memória do coração decidi escrever. Foi divertido fazer uma releitura pois sempre gostei de histórias com humor e acumulativas. Na minha história o final é inesperado e vai divertir muito os leitores.

Clara Haddad

Como foi o processo de colaboração com o ilustrador Canizales para criar as imagens que complementam sua narrativa em “A Vehinha e o Porco”?

Este processo foi diferente dos outros. Não fiz nenhuma sugestão ao ilustrador. Já em minhas obras anteriores, estive envolvida em todas as fases, desde a seleção do artista até a definição da capa e das ilustrações, pois a primeira publicação ocorreu em Portugal pela Fábrica das Histórias que é a minha pequena editora independente e os direitos foram adquiridos pela Telos para a publicação no Brasil. No entanto, no caso do livro da “Velhinha e o Porco”, a Telos vai fazer a primeira publicação da obra. Acompanhei o processo enquanto autora e me detive mais nas questões do texto. A edição foi conduzida pelo editor brasileiro, Erivan Gomes.

O evento no Memorial da América Latina marca um marco importante em sua carreira. Quais são suas expectativas e sentimentos ao celebrar esses 25 anos de contribuições à arte da narração?

Expectativa não sei, mas o sentimento é de gratidão por trilhar um caminho que escolhi para mim e que muitos julgaram uma loucura! Mas o que é certo e que são 30 anos de carreira artística e 25 de narração de histórias com muito sucesso, mais de 19 países visitados e um público de mais de 500 mil pessoas e isso é um feito: viver de arte e daquilo que escolhemos e amamos fazer. No memorial, o que desejo é fazer uma excelente apresentação e apresentar o novo livro para o público brasileiro com muita alegria e energia.

Você mencionou que o espetáculo especial será acompanhado pelo músico Ramiro Marques. Como a música contribui para a sua forma de contar histórias e o que o público pode esperar desse momento musical?

A parceria com o Ramiro é ótima pois ele sabe criar e entrar com a música na hora certa da narrativa e tudo flui muito bem! Criando um ambiente sonoro para o momento narrativo. Há sintonia no nosso trabalho e quando existe essa conexão entre a música e a palavra tudo fica ainda mais mágico.

Olhando para o futuro, quais são os próximos passos ou projetos que você gostaria de realizar na área da narração oral?

Tenho um novo projeto que é uma mentoria coletiva para as pessoas que desejam contar histórias e aprender este ofício ou melhorar a sua atuação na área. Essa mentoria tem o nome de “Confraria da Palavra” e será lançada oficialmente também no dia 25 de novembro. O projeto é uma marca registada e pioneira pois é o primeiro clube de storytelling e literatura a nível mundial com sessões mensais que vai iniciar em janeiro do próximo ano.

Como você vê o papel da narração oral na preservação e compartilhamento das tradições culturais, especialmente na interseção entre as culturas brasileira e portuguesa?

Fundamental! As histórias são a alma de um povo, se deixamos de partilhar nossas histórias perdemos nossa memória e a memória de quem somos! A cultura brasileira e portuguesa tem pontos de encontro, assim como, com outras culturas pois tudo parte da mesma base: sentimentos humanos e isso em igual em todos! Não importa se és brasileiro, português, japonês, finlandês… existem características de cada local, mas o que é o nosso sentimento humano não muda. Teremos sempre sentimentos de medo, amor, dor, tristeza, alegria, esperança e é através de nossas histórias de vida e literárias que partilhamos isso.

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