Assombro de Bixo lança “Xote Sem Futuro” com crítica afiada ao machismo estrutural

Luca Moreira
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Assombro de Bixo
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Com letras afiadas, sonoridade brasileira e inspiração em raízes populares, a banda mineira Assombro de Bixo lança “Xote Sem Futuro”, terceiro single do álbum viabilizado pelo Programa Cultural Murilo Mendes (PCMM). A nova canção, marcada por ironia e crítica social, retrata o embate entre dois homens em uma feira — símbolo da convivência nacional — para expor o machismo cotidiano presente em diferentes regiões do Brasil. O grupo, formado por sete integrantes, segue misturando elementos do repente, da musicalidade afro-brasileira e da poesia popular em uma proposta autoral que valoriza a cena cultural de Juiz de Fora.

A música “Xote sem futuro” apresenta um retrato irônico e doloroso de uma masculinidade que se afirma pela disputa e pela ausência de escuta. Como vocês decidiram transformar esse embate cotidiano em poesia e canção? E por que escolher a feira como cenário simbólico para essa crítica?

Se não me falha a memória a música começou com os versos iniciais “Foi naquela feira de domingo que o caboclo sem destino saiu para trovejar/ Subiu na cabeça o desatino foi pra mais um desafio, quem vai lhe apelejar?…” e a intenção era desenvolver uma história que contasse mais sobre o embate entre dois personagens masculinos. A partir daí, naturalmente a canção tomou pra si esse tom de crítica e reflexão social. E a escolha da feira se deve ao fato dela ser um dos espaços mais populares do nosso Brasil, e tanto o projeto quanto a música em si, busca traduzir vivências de qualquer região do país.

Vocês trazem em suas músicas uma interseção poderosa entre crítica social, ritmos populares e poesia falada. Como é o processo de criar algo que dialogue com o passado cultural do Brasil, mas que também aponte para os desafios urgentes do presente?

Se nós tocamos um pagode de viola, maracatu, ijexá e congada é porque estamos na condição de aprendizes e agentes de manutenção, ou seja, esse conhecimento veio até nós, através de um mestre, uma mestra ou até mesmo um artista e a partir das nossas vivências refletimos e criamos com isso.

A cosmogonia munduruku, que inspira o nome da banda, fala de origens, de território e de identidade coletiva. De que maneira essa visão ancestral influência o som e a mensagem de vocês enquanto artistas contemporâneos?

De todas as maneiras. Se não fossem os que vieram antes de nós e que tanto criaram quanto deram continuidade, nossa música e nossas ideias não existiriam.

Assombro de Bixo
Assombro de Bixo

“Assombro de bixo” já sugere no nome algo inquietante, algo que provoca. O que vocês sentem que mais incomoda – ou desperta – no público quando escutam suas músicas?

Pelos relatos que já ouvimos nós despertamos a curiosidade do pessoal pela quantidade de elementos musicais que acontecem simultaneamente, mas não se embolam e também pela variedade de ritmos executados, as vezes, numa mesma música.

A escolha de ritmos como xote, o repente e os sons afro-brasileiros mostra um enraizamento forte com a música de raiz. Vocês enxergam essa fusão como resistência estética? Como ela ajuda a contar as histórias que querem contar?

Não, porque primeiramente não é a nossa intenção se colocar nesse lugar de resistência. Creio eu que esse lugar pertence a quem realmente vive e representa a cultura popular, ou seja, os violeiros tradicionais, os mestres e as mestras. Nós apenas brincamos, no melhor sentido da palavra, com esses elementos e buscamos divulga-los. Segundo que esses elementos estão em alta na música popular brasileira há algum tempo, e logo não seria resistência nenhuma fazer algo que todos já estão fazendo. Apesar de toda essa reflexão, esses ritmos nos ajudam a ilustrar aquilo que sempre buscamos enquanto identidade: falar e pensar sobre o Brasil profundo.

Na cena independente, especialmente fora dos grandes centros, a valorização dos artistas locais é um gesto político e afetivo. Por que é importante para vocês manter essa conexão com a arte produzida em Juiz de Fora e região?

Porque nós temos orgulho da nossa origem e da riqueza cultural que ela possui. Juiz de Fora é uma cidade efervescente culturalmente, cheia de grandes artistas que nos inspiraram e seguem inspirando. É óbvio que queremos alçar grandes voos, conhecer lugares diferentes e levar nosso som adiante, mas nada mais importante que honrar nossas raízes.

Assombro de Bixo
Assombro de Bixo

A construção coletiva é uma marca forte da banda, tanto na composição, quanto na performance. Como vocês equilibram as diferentes vozes, ideias e vivencias para chegar a um som que represente o grupo inteiro?

Não tem uma receita, basicamente o que acontece é bem orgânico. As vezes alguém traz uma música e pensamos o arranjo de forma conjunta, assim como também acontece de alguém já chegar com ideias mais prontas e passar pro restante do grupo. De qualquer forma sempre existe a provocação de que todos sejam protagonistas em algum momento, ninguém sozinho assume essa postura de líder de banda. O que as vezes torna as coisas um pouco mais demoradas, mas vale a pena o resultado.

Vocês já passaram por festivais e projetos importantes, como o Festival de Piacatuba e o Palco Central. Como essas experiências moldaram o caminho da banda? E que horizontes vocês desejam alcançar a partir de agora?

Óbvio que tudo isso são grandes experiências, principalmente pra alguns membros da banda que não tinham tanto essa vivência de palco, mas acredito que esses festivais funcionaram mais como um reconhecimento do nosso trabalho do que qualquer outra coisa; nos deu aquele gás e confirmou que estávamos no caminho certo. De agora em diante, com nosso primeiro trabalho de estúdio saindo do forno, nossa ideia é sair tocando por aí e tomar aquele fôlego criativo pra seguir compondo coisas novas e produzindo mais material desse trabalho assombroso.

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