“Eu, Minha Crush e Minha Irmã”: Novo livro de Bia Crespo explora relacionamentos complexos

Bia Crespo (Mauro Figa)

O livro de estreia da escritora e roteirista Bia Crespo, “Eu, Minha Crush e Minha Irmã”, lançado recentemente pela editora Seguinte, é uma história hilária e cativante sobre primeiros amores, o amor entre irmãs e o amor-próprio. Com um enredo que combina romance sáfico, um namoro de mentira e amadurecimento, a obra oferece uma visão cativante sobre as complexidades dos relacionamentos.

A história é centrada em um trio de garotas: Tamires, Antônia e Júlia. Tamires é a jovem popular e sempre rodeada por pretendentes, principalmente entre as meninas. Sua vida social é agitada, mas, surpreendentemente, suas ex-namoradas se tornam suas amigas. No entanto, ela não é a protagonista deste livro. Antônia, sua irmã caçula, sente que é uma versão sem graça da irmã mais velha e prefere a tranquilidade de sua vida caseira e de assistir séries. Quando Júlia entra na vida das irmãs, um novo desafio surge.

No esforço de fazer Antônia se enturmar, Tamires dá uma festa em seu apartamento, onde surge o terceiro elemento da história: Júlia. Antônia fica encantada por Júlia e, ao perceber sua atração por garotas, percebe que é lésbica, como a irmã. No entanto, quando Júlia decide conquistar Tamires, a trama se complica. Ela propõe que ela e Antônia finjam um romance, na esperança de se aproximar de Tamires. Enquanto inicialmente Antônia concorda com o plano, sentimentos reais começam a surgir, levando a situações complicadas e corações partidos.

Bia Crespo, roteirista, escritora e produtora, traz sua habilidade de criar histórias ricas em emoções para as páginas de “Eu, Minha Crush e Minha Irmã”. A obra oferece uma exploração cativante de relacionamentos complexos, misturando risadas e lágrimas, tornando-a uma leitura envolvente para fãs de literatura LGBT+.

A autora, formada em audiovisual, tem uma carreira sólida no cinema e na TV, e agora traz seu talento para a escrita literária. Com uma narrativa envolvente, Bia Crespo apresenta uma história que vai além das páginas do livro e entra no imaginário dos leitores.

Como surgiu a inspiração para a trama de “Eu, Minha Crush e Minha Irmã”? Houve alguma experiência pessoal ou fonte de inspiração específica?

A trama não poderia estar mais longe da minha experiência pessoal: eu não tenho irmãos, rs. Sempre tive fascínio (e inveja) pelas relações entre irmãos, especialmente irmãs mulheres. É uma mistura de competição com admiração que as pessoas levam para a vida inteira. Tive muitas amigas que eram lindas, inteligentes, bem-sucedidas, mas, por serem irmãs mais novas, achavam que a mais velha era a favorita. Juntando tudo isso com a trama do namoro falso, que é meu tropo favorito da literatura, surgiu Eu, minha crush e minha irmã. A parte pessoal que coloquei na história foi a vivência da Antônia na faculdade de cinema e também seus primeiros passos como lésbica nessa época. Pra mim foi um momento super importante e intenso e achei que seria legal ambientar a história nesse universo, até porque não vejo muitas obras que tratem da experiência universitária brasileira.

O livro trata de temas como o primeiro amor, o amor entre irmãs e o amor-próprio. Qual desses temas é mais significativo para você e por quê?

O amor-próprio é um tema que considero superimportante e necessário. Não à toa é um dos temas principais da literatura jovem adulta. É muito comum que nessas histórias as pessoas estejam se descobrindo, se tornando quem elas serão pelo resto da vida, e ganhando confiança para ser quem são. Poder ajudar as pessoas a embarcarem nessa jornada de auto-descoberta e auto-afirmação é um privilégio e uma honra.

Tamires, Antônia e Júlia são personagens muito diferentes. Qual delas você se identifica mais e por quê?

Eu acho que tenho elementos das três. Quando eu era mais nova, era bem parecida com a Antônia em termos de falta de confiança e comparação com os outros. Me sentia muito perdida na faculdade de cinema, assim como ela fica no livro, porque eu gostava de filmes populares e todo mundo era super cult. Hoje em dia eu acho que sou mais parecida com a Tamires, que é uma pessoa confiante e tem esse papel de conselheira do grupo. Mas eu já fui muito emocionada que nem a Júlia, rs, capaz de fazer qualquer coisa para conquistar alguém.

O enredo envolve uma situação peculiar de um “namoro de mentira”. Como isso contribui para o desenvolvimento da história e das personagens?

A trama do relacionamento de mentira veio naturalmente, talvez por ser um dos tropos literários que eu mais gosto. Acho que é uma forma muito rápida e eficaz de elevar o conflito romântico e escalonar os riscos ao longo da história, principalmente quando lidamos com personagens inseguras demais para confessar seus sentimentos, como é o caso da Antônia. Júlia é a força motriz dessa história. Ela inventa o plano maluco de ter um namoro falso com a Antônia só para ficar próxima da Tamires. No fundo, ela precisa provar constantemente que consegue ser melhor, que pode chegar onde ninguém chegou — que, no caso, é namorar a Tamires. De uma certa forma, esse caos todo é o que coloca Antônia em movimento e a tira da zona de conforto. Eu gosto de pensar que Antônia e Júlia são pessoas que tinham muito a aprender uma com a outra. Não é à toa que elas se encontraram.

O livro aborda a temática LGBT+ e a descoberta da sexualidade. Qual mensagem você gostaria de transmitir aos leitores sobre essa parte da história?

Quando eu era adolescente, nos anos 2000, não havia praticamente nenhum livro com temas LGBTQIAP+. Filmes e séries eram pouquíssimos e super difíceis de achar, isso quando não eram tragédias horríveis. Tenho certeza de que isso atrasou minha saída do armário e a compreensão de que eu era lésbica, tanto que só fui me afirmar depois dos 25 anos. Acho extremamente importante que adolescentes e jovens adultos tenham contato com todos os tipos de representação na literatura, de forma que possam se enxergar nas páginas e ver as possibilidades para si próprios. Essa fase da vida é cheia de descobertas, tentativas e erros, então, se eu puder tornar isso mais fácil para alguém, terei feito meu trabalho.

Bia Crespo

O ambiente universitário e o curso de cinema são cenários importantes no livro. Como você acha que esses ambientes influenciam as escolhas e a jornada das personagens?

Essa fase universitária é um rito de passagem na vida de muitas pessoas. A gente entra adolescente e sai adulto. Acho importante ambientar uma história de amadurecimento e auto-descoberta em um universo onde somos enfim confrontados com nossa identidade, com o papel que vamos ter no mundo. Gostaria de ver mais histórias que mostram a experiência universitária brasileira, que é totalmente diferente da americana, tão comum em filmes e séries. A faculdade pra mim não serviu para muita coisa em termos acadêmicos ou profissionais, mas foi um divisor de águas para minha formação como ser humano. Isso se reflete completamente nas jornadas de Antônia e Júlia — enquanto a primeira está fazendo o curso que sempre quis com apoio da família, a outra precisa mentir para ter aprovação dos pais. São conflitos importantes que dão ainda mais profundidade ao problema amoroso que elas estão passando. Na faculdade eu me sentia assim: tudo acontecendo ao mesmo tempo, com muita intensidade.

A comédia é um elemento essencial na trama. Como você equilibrou o humor com as emoções mais profundas ao escrever o livro?

A minha experiência nos filmes e séries ajudou muito nesse sentido. Um bom roteiro de comédia é aquele que faz a pessoa chorar logo depois de gargalhar. A gente mexe muito com a emoção do público em uma hora e meia, então tomei cuidado para colocar essas viradas dramáticas na experiência literária. Em filmes como 10 Horas Para o Natal e A Sogra Perfeita eu acho que encontrei bem esse equilíbrio, assim como na série Rensga Hits!. O segredo da comédia é não ter medo de ser cafona. Quando mais piadas e mais emoção, melhor. As pessoas querem se conectar e as histórias precisam estar abertas a isso.

Qual foi o maior desafio que você enfrentou ao criar a dinâmica entre os personagens e manter o suspense e a surpresa na trama?

Fiquei morrendo de medo das pessoas rejeitarem a Júlia! Acho que foi a personagem que mais sofreu mudanças ao longo da edição. Eu pensei muito sobre as complexidades dela e suas motivações para que fosse possível que o público a perdoasse. Ao mesmo tempo, elevei o conflito com a chegada de outra personagem feminina (sem spoiler!) que parece perfeita para a Antônia, mas que, na verdade, se mostra a amiga que ela precisava esse tempo todo. No mundo sáfico é muito comum a gente andar em uma linha tênue entre amor e amizade e eu quis aproveitar isso no livro para aumentar o conflito e o suspense.

“Eu, Minha Crush e Minha Irmã” toca em questões de autodescoberta e aceitação. Como você espera que os leitores se conectem com esses temas?

A ideia é que não devemos nos comparar com ninguém, seja com a irmã mais velha, seja com aquele primo concursado ou com o vizinho que passou em uma faculdade pública. Esse também é um assunto recorrente entre adolescentes e jovens adultos, por isso decidi abordá-lo no meu livro para mostrar que nós devemos nos bastar. Essa comparação é besteira e, ao longo da vida adulta, vamos nos distanciando cada vez mais disso. Individualidade e confiança fazem parte da busca pela maturidade.

O livro recebeu uma ótima resposta dos leitores. Que tipo de reações você tem recebido e como isso impacta você como autora?

Eu fiquei surpresa com a recepção positiva e entusiasmada porque vim do total anonimato literário – a maioria dos autores de literatura jovem adulta veio do Wattpad ou das publicações independentes. Eu saí do absoluto zero mesmo, sem nunca ter publicado nem uma fanfic com meu nome. Mas as pessoas foram super receptivas e eu tive muito apoio de outros autores, especialmente dos LGBTQIAP+. Tirei print de várias resenhas e mensagens que recebi de leitoras e separei para ler quando estiver triste com minha carreira no audiovisual, rs. Ao contrário do escritor, o roteirista é muito desvalorizado, às vezes até mesmo apagado de seus próprios projetos. Essa recepção positiva me faz sentir que minha mensagem está chegando nas pessoas e as impactando como eu queria. A literatura sáfica ainda está engatinhando no Brasil e no mundo, por isso sinto que sempre tem espaço para mais gente. Que sejamos muitas!

Acompanhe Bia Crespo no Instagram

TAGGED:
Share this Article

Você não pode copiar conteúdo desta página