Andréa Brêtas prepara exposição para impactar e conscientizar público sobre a mutilação genital feminina

Luca Moreira
12 Min Read
Andréa Brêtas (Foto Andréa Brêtas)

A fotógrafa e artista plástica Andréa Brêtas apresenta a exposição “Pranto”, onde traz fotos de mulheres africanas em quatro salas do Espaço Cultural Correios Niterói RJ, em preto e branco, para conscientizar sobre a violência contra a mulher, principalmente sobre a MGF – Mutilação Gentital Feminina, que, segundo o Unicef, vitimiza, ainda hoje, milhões de mulheres e meninas em todo mundo e que, a cada ano, atinge cerca de três milhões de meninas, antes de completar 15 anos.

A mostra não traz cores porque tem o objetivo de provocar reações e conexões com o observador, mas traz visivelmente o respeito do olhar de Andréa Brêtas e a excelência da curadoria da Tartaglia Arte na escolha de temas de impacto e importância socio-culturais.

“Pranto” acontece entre os dias 28 de janeiro e 11 de março de 2023, não por acaso. Desde 2012, a data de 06 de fevereiro foi adotada como o Dia Internacional da Tolerância Zero à Mutilação Genital Feminina, por unanimidade, em votação da Assembleia Geral das Nações Unidas (Resolução 67/146). No dia 08 de março, comemoramos o Dia Internacional da Mulher. Em ambas as datas, Andréa Brêtas estará presente para visita guiada e bate papo com outros profissionais para falar sobre o tema. Confira a entrevista!

Ao demonstrar por meio da fotografia um tem bastante sensível que é a mutilação genital feminina, você acabou trazendo um retrato de uma das violências mais cometidas contra as mulheres no mundo. No caso do seu trabalho, como acredita que poderá ser o impacto dele na população?

Espero, sinceramente, que através das imagens e da abordagem do tema eu consiga conscientizar um número grande de pessoas a respeito de toda violência que ainda hoje as mulheres são vítimas. Falar sobre MGF é lembrar que em pleno século XXI mulheres sofrem com o domínio sobre seus corpos e sua sexualidade.

Falando ainda sobre impactos, a sua obra acaba por transmitir uma mensagem de conscientização sobre a mutilação genital feminina, principalmente entre o dia 6 de fevereiro – Dia Internacional da Tolerância Zero à MGF – e o dia 8 de março – Dia Internacional da Mulher. Porém, por mais que infelizmente ainda não tenhamos extinguido essa violência, nós já estamos cercados de mensagens que pregam a conscientização. Quais são os principais diferenciais que tem previsto na utilização da fotografia como forma de solução?

Através da fotografia se faz a diferença por se acreditar no poder da linguagem visual, no impacto das imagens, na compreensão da dor através do olhar, na documentação do sofrimento com lentes de aumento.

Andréa Brêtas (Foto Andréa Brêtas)

Em uma matéria veiculada em fevereiro de 2015 na BBC News Brasil, a jornalista Ayca Abakan realizou uma reportagem com a psiquiatra Sahika Yuksel, em Istambul, e que tentaram compreender como funciona a mente de um estuprador e o que o levava a cometer tais violências. Sendo uma pessoa que está trabalhando com esse tipo de assunto, você conseguiria pensar em uma provável solução para esse problema no mundo ou entender o porquê dos casos?

Meu estudo e consequentemente as imagens por mim produzidas não tratam em específico do tema do estupro. Acredito, porém que todo e qualquer tipo de violência necessite de uma equipe multidisciplinar que abrace e trate da complexidade do tema desde sua origem.

Você chegou a revelar que dentre as viagens que já fez, a África tem se tornado o seu destino favorito, tanto é que a sua exposição apresentará da Namíbia e do Quênia com o objetivo de criar um contratempo entre o olhar de mulheres de cada país. Como tem sido a missão de além de passar uma mensagem superimportante, também promover essa junção de culturas?

Quando das minhas viagens à África nunca pensei do cumprimento de algum tipo de missão. Meus enfoques brotaram de um apelo intimo, particular e profundo sobre todo o sofrimento que ainda é imposto às mulheres. Gosto e aprecio os contrastes. Acredito que as diferenças, ao contrário do que se pensa, muitas vezes, acabam por aproximar povos e pessoas.

Andréa Brêtas (Foto Andréa Brêtas)

Diferente do Quênia, que de acordo com sua declaração, os casos seriam insanos, uma curiosidade que chegou a apresentar, era de que na Namíbia, não existiria a questão da mutilação. Porque acha que esse crime acontece em massa em alguns lugares, porém, não ocorre em tenta decorrência em outras regiões do mundo?

Muitos são os argumentos para se justificar a Mutilação Genital Feminina. Uns acreditam que o cunho seja religioso (apesar da prática não estar descrita em nenhum texto sagrado). Outros alegam ser cultural. Busca por aceitação através da moralidade e manutenção dos bons costumes. Há entendimentos que possam ser manobras políticas de domínio da população segundo a ativista egípcia Nawal Sadawi. O que se observa é que em alguns países a observância da proibição legal é cumprida. Em outros não.

Uma das histórias que trouxeram o tema da mutilação genital feminina foi o caso da modelo somali Waris Dirie, que teria trazido a tona o tema, até então desconhecido, em uma entrevista para a Revista Marie Claire em 1996 e teve sua história narrada no filme “Flor do Deserto” da diretora Sherry Hormann em 2009. Em sua opinião, Waris Dirie foi uma heroína ao servir de exemplo para que as mulheres exponham e não tenham medo de lutar contra a MGF?

Waris Dirie fez uso de sua projeção e notoriedade para chamar atenção para todo o sofrimento que se impõe às mulheres/meninas de várias comunidades espalhadas pelo mundo. Foi, sem sombra de dúvidas, um ato de coragem e ousadia que ajudou a expor tamanha crueldade aos olhos do mundo.

Andréa Brêtas (Foto Andréa Brêtas)

Não enaltecendo ódios ou muito menos determinando lados políticos, seguindo apenas por uma questão de opinião. Atualmente no Brasil, o crime de estupro que resulte em lesão corporal grave ou em casos da vitima ter entre 14 e 18 anos, a pena de prisão gira em torno de 8 a 14 anos, e em caso de morte, de 12 a 30 anos. E tendo em vista que a pena de morte é proibida pela Constituição Federal Brasileira desde a Proclamação da República em 1889, salvo em casos de guerra. Qual é a sua opinião sobre a punição que existe em relação ao estupro ou a do crime de mutilação genital feminina?

Na verdade, não tenho opinião pessoal sobre o tema. Sou uma fotógrafa com o objetivo maior de provocar a discussão, fazer ecoar o grito das mulheres oprimidas e invisíveis. Meu trabalho é instigar, provocar, fazer pensar sobre realidades que muitas vezes a sociedade tenta esquecer.

Apesar das fotos não trazerem cores devido ao objetivo de provocar reações e interpretações diversas pelos observadores, a obra trouxe visivelmente o seu olhar sobre a MGF. O quanto produzir todo esse projeto realmente impactou na sua vida e na maneira de ver o mundo?

O impacto é brutal e inevitável. Como mulher não se sai imune da experiência de conscientização plena sobre o enorme sofrimento ao qual são submetidas milhões de meninas/ mulheres ao redor do mundo. Nascer mulher tem que ser prazeroso. Lutar pelas mulheres que não desfrutam desse prazer é um dever de todos nós.

Além de você, quem está envolvida nessa exposição é a Tartaglia Arte, que além de estar fazendo a curadoria, também participou na escolhe de temas de impacto e importância socioculturais. Como tem sido trabalhar com eles e o que o público pode esperar dessa exposição?

É gratificante e prazeroso trabalhar com uma curadoria de qualidade e competência. O público pode esperar uma exposição com imagens impactantes e que chamarão o espectador à reflexão.

Em relação a esse crime de mutilação genital feminina e estupro, estarem muito com a imagem (e com a razão, em muitos casos!) dos integrantes do sexo masculino como vilão. Você acredita que as mulheres, mesmo sofrendo com tudo isso, tenham que tomar cuidado ao não impor também um preconceito generalizado sobre os integrantes do sexo oposto, por mais que a esmagadora maioria dos crimes tenha sido cometida por homens?

Claro que não há motivos para generalização. Não são os homens que cometem essas atrocidades, mas sim uma pequena parte deles. Culpar o sexo masculino por todas as mazelas às quais são submetidas às mulheres seria uma insanidade extrema.

Sendo a mutilação uma prática que atinge mais de 200 milhões de mulheres anualmente no mundo inteiro, sendo 29 milhões apenas na África, eu te pergunto – você como mulher, se sente realmente segura ao sair de casa no dia a dia? O que passa pela cabeça ao saber que milhões de semelhantes do mesmo sexo estão presentes em estatísticas no mundo todo?

Totalmente segura, não. Independente disso, minha liberdade é plena. Isso é um privilégio. Um privilégio que deveria ser concedido a todas. Saber que milhões de mulheres não desfrutam do mínimo de autonomia é extremamente desumano e inaceitável.

Serviço:

Exposição: Pranto

Artista: Andréa Brêtas

Curadoria: Riccardo Tartaglia e Regina Nobrez

Marchand e assessora da artista: Georgia Nolasco

Abertura: 28 de janeiro de 2023 das 13h às 18h

Visitação: 28 de janeiro a 11 de março de 2023  

Local: Espaço Cultural Correios Niterói

Av. Visconde de Rio Branco, 481 – Centro – Niterói/RJ 

De segunda a sexta, das 11h às 18h e sábado,  das 13h às 17h 

Entrada: gratuita

Classificação: livre

Assessoria de imprensa: Paula Ramagem

Apoio: Consolato Onorario Italiano – Florianópolis/SC – CIB/SC – Espaço Cultural Correios
Acesso: Barcas (Estação Araribóia), UBER, táxi, ônibus. Do Rio, metrô ou ônibus até a Estação Carioca, caminhar até a Estação das Barcas na Praça XV. O local possui acessibilidade.

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