Sandro Araújo fala sobre “Novembro”, novo filme que dará foco ao tabu da sensibilidade masculina

Luca Moreira
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O escritor Sandro Araújo tem descoberto uma nova paixão em sua vida, a atuação. Ele é o protagonista do filme “Novembro”, que fala sobre a sensibilidade masculina e retrata a solidão de muitos homens em busca de um padrão imposto pela sociedade. O longa, que será lançado em breve, é uma adaptação de um dos seus cinco livros, “Solidão e Destino”, escrito em 2010. Ele conta sobre a trajetória que o levou para a frente das câmeras, fala sobre seus livros, expõe sua relação com a esposa, a atriz Railane Borges, e revela tudo sobre seus projetos.

A escolha do livro para ser a primeira adaptação para o audiovisual foi decidida por Sandro e pela esposa, a atriz e diretora, Railane Borges, que também é sua sócia na produtora Mirenax. Confira a entrevista!

Nessa última semana foi anunciado a sua participação como protagonista do filme “Novembro”, que faz uma abordagem interessante sobre a sensibilidade masculina. Sendo essa sua primeira vez nas telonas, como tem sido a sua preparação para o projeto?

A preparação não foi simples, porque o “Novembro” é baseado em romance que escrevi em 2010, o “Solidão e Destino”. É um drama com traços autobiográficos muito fortes, sobre um homem solitário e infeliz. Isso ajudou e atrapalhou. Ajudou porque visitar o Sandro de 2010 trouxe de volta uma carga emocional muito grande, que teve tudo a ver com a desgraça que o personagem do filme vive. Atrapalhou pela mesma razão que ajudou. Porque mergulhei em um passado que fez doer. Além disso, a direção do filme fez um trabalho muito intenso para caracterizar o personagem de forma que as nossas personalidades não se misturassem. Era importante criar um protagonista que não se confundisse com o que o Sandro é hoje. Somando essa avalanche de emoções, o resultado ficou bem visceral.

Uma coisa interessante em falarmos sobre o mundo masculino, é que a sensibilidade é algo muito enraizado em relação aos sexos. Muitos observam o homem como um ser que sempre tem que mostrar resistência a qualquer situação da vida e tudo mais. Você fica feliz em poder tratar de um assunto que atualmente é aberto à tantas discussões assim?

Fico muito feliz. O livro já era um grito contra esse estigma. E levar esse conteúdo audiovisual para as pessoas é muito bacana. A sociedade cobra que os homens tenham um comportamento padronizado, sejam “machos alfa” que atropelam as próprias emoções para mostrar força e a tal masculinidade. Desde muito cedo os meninos são orientados a esconder seus sentimentos ou, mostrá-los de uma forma que seja aceita por seus pares. O filme mostra isso de forma clara, mas também poética. O protagonista sofre explicitamente e sua confusão mental emociona quem está ao redor.

Originalmente escrito em 2010, o longa é uma adaptação de “Solidão e Destino”, uma obra literária escrita por você em um momento em que se encontrava extremamente solitária apesar de estar sempre cercado de pessoas. Você acredita que na vida de um autor, todos os aspectos podem vir a se tornar inspiração? Como enxerga os efeitos que suas obras proporcionam?

Interessante como tudo o que é intenso gera inspiração para escrever. E nesse caso, foi exatamente isso. Emoções que não são digeridas em doses pequenas, acabam por transbordar e para mim, esse transbordamento é canalizado para a escrita. Em todos os livros que escrevi, e foram cinco, há traços do que eu vivi. E é bacana como pessoas que me conhecem desde criança reconhecem isso nos textos. Interessante que em todas as obras eu colhi muitas impressões dos leitores, que buscavam formas inusitadas de chegar até mim. Até mesmo me esperar na saída do trabalho para falar dos livros. Acho isso de uma singularidade muito legal na minha jornada.

O tema abordado é considerado um verdadeiro tabu na sociedade atual, assim como já mencionamos sobre ele em uma pergunta anterior, no momento em que escrevia o livro como uma crítica, você chegou a ter medo de levar alguma represália ou de “cutucar” essa parte mais conservadora do público?

Mas isso realmente aconteceu e eu, logo após publicar o livro, já esperava isso. Poucos homens me deram os parabéns pelo “Solidão e Destino”. A massa criticou a postura do protagonista, de forma muitas vezes jocosa e fazendo pouco caso, justamente, do que estava sendo abordado ali, que era sensibilidade de um homem. Muitas mulheres que leram, relataram o choro incontido em muitas passagens e identificaram a peculiaridade do personagem sofrer a olhos vistos.

Em relação ao momento de solidão que estava passando na década passada, quando escreveu o livro. Você conseguir externar esses sentimentos em um texto o ajudou a se sentir melhor consigo mesmo, ou quem sabe evitar que uma depressão se agravasse?

Escrever é o transbordamento das emoções que me tomam. Olhando por esse prisma, é sempre um ato que serve de aliado nesses momentos extremos, até mesmo para ordenar os pensamentos e tentar se enxergar no meio das tempestades emocionais me assolam em muitos momentos. Eram sim uma tentativa de conter o avanço de uma depressão que se tornou severa com o tempo. Mas a configuração do meu mundo naqueles anos não me deixaram muito apto para me defender disso. Invariavelmente, eu pensava estar totalmente imerso no “Solidão e Destino”, sem muitas chances de colocar a cabeça para fora d’água.

Qual mensagem espera conseguir transmitir através do lançamento desse novo filme e como está sendo ver esse momento verídico de sua vida sendo retratado no cinema a partir de uma representação artística? O sentimento é de orgulho?

Espero que o mundo enxergue que ser um homem sensível não é crime. Que isso não traz nenhum tipo de condição para acontecer. Homens são assim. Porque a humanidade é assim e ao longo da jornada desaprendeu a ser sincera com seus próprios sentimentos. Bacana olhar para a tela e perceber que senti as mesmas coisas retratadas ali, mas que sobrevivi e deixei essas bagagens para trás. Tenho muito orgulho do filme em diversos aspectos. Esteticamente, como obra de audiovisual e de arte e, principalmente, como um retrato do que a sociedade é ao lidar com emoções.

Apesar de só estar estreando agora como ator, soubemos que você já havia feito cursos de interpretação ainda na sua adolescência, porém, nunca havia aplicado ainda. Hoje, já adulto, tem algo que ainda esteja encontrando dificuldades, ou interpretar os próprios acontecimentos da vida, o dá certa confiança a mais?

Nossa. Foi muito difícil achar o tom. Porque não era apenas eu ali. Contracenei com atrizes sensacionais, como Lara Lazzaretti e Iasmin Patacho. Nesses momentos contei com a generosidade delas, principalmente dos diretores do filme e da minha consciência de que era eu que tinha muito o que aprender no set. As cenas que fiz sozinho foram um pouco mais fáceis, pois a memória emocional agiu de forma intensa.

Teria alguma dica ou recomendação para o público que deseje assistir ao filme nos cinemas em breve?

Assistam com o coração aberto para ver uma avalanche de emoções intimistas. Permitam-se rir e chorar com a história. E saiam da projeção com o coração decidido a ser ele mesmo.

 

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