Homens na educação infantil: uma questão de cultura e oportunidades

Luca Moreira
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Você se lembra de ter tido algum professor homem nos seus primeiros anos de escola? Ou melhor, que não tenham sido de algumas aulas específicas como educação física, artes, judô, natação, capoeira, ou música? No ano de 2018, uma pesquisa encomendada pela Fundação Telefônica Vivo, mais especificamente para a celebração do Dia Internacional das Mulheres daquele ano, apontou que 80% dos docentes que atuavam na educação básica brasileira eram pessoas do sexo feminino. Essa pesquisa foi publicada com base no Censo Escolar de 2018. Em outubro de 2016, Claudia Gasparini da Revista Exame divulgou na época uma lista das carreiras mais cobiçadas pelos sexos, e enquanto a pedagogia liderava a lista das mulheres, o curso de Direito ainda era o favorito dos homens.

Com a finalidade de trazer à tona as opiniões do público em relação ao que leva a esse desequilíbrio de gêneros na educação primária, a Moreira Comunicação acabou realizando uma pesquisa online com alguns entrevistados para tentarmos chegar a um consenso. As buscas acabaram levando a dois pontos principais – a questão cultural e a de oportunidades na área.

Foto: Pixabay

A cultura da feminização escolar

Durante muito tempo, basicamente no início do século XIX, o movimento feminista dava seus primeiros passos, e diferente do machismo, as definições para o feminismo era de trazer um conjunto de movimentos que lutassem por proporcionar direitos comuns entre homens e mulheres, quebrando assim a predominância do machismo. Vocês podem até se perguntar porque estamos tocando nesses tópicos políticos, porém, quando começamos a falar das questões precisamos voltar naquele modelo “ultrapassado” de sociedade onde a função principal da mulher era com os cuidados da casa e dos filhos, enquanto para homem, era a de prover sustento, comida e moradia a sua família. A associação do conceito social com o desequilíbrio nos quadros docentes pode ser considerado um ponto positivo para nossa incógnita.

Olhando de cima, parece que na educação, os quadros do mercado de trabalho se invertem, onde muitos homens que estão alocados em aulas extraclasses, como música, informática ou esportes. Nesse ponto, o entrevistado José Luiz, que é pai de dois filhos, concordou que apesar da qualidade de ensino se manter igual em ambos os sexos, o déficit da presença masculina, também está ligado à cultura: “Não vejo diferença na educação dada por professores ou professoras. O porquê de ter mais professoras na educação infantil pode ser cultural. Outro detalhe é que já no caso de professores de educação física, me parece que o processo se inverte.”

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Maternalismo e Paternalismo andando juntos

Uma das dúvidas que muitos possuem quando estão pensando em iniciar o caminho para suas vidas profissionais é justamente fazer a escolha certa de suas profissões. Na educação isso não é diferente. A maioria dos testes vocacionais buscam decifrar a aptidão das pessoas a partir de um questionário que fala sobre criatividade, jeitos de ser, formas de agir, entre outras características que são apuradas e depois comparadas com os requisitos de cada profissão. Porém, o que muitos esquecem, é que assim como acontece com a natureza ao nosso redor, nós mesmos sempre estamos em uma constante mudança. Uma pessoa que você conheça e elabore um conceito sobre ela, poderá não ser a mesma daqui a 10 anos, tanto nas questões pessoais como profissionais. Os nossos perfis também são assim.

Utilizando como base um artigo publicado por Cássio Ricardo Fares Riedo no site da UNICAMP em 2018, ele descreve que um dos pontos que levam ao número maior de mulheres nas salas de aula é o sentimento de maternagem, que além de se tornar algo estereotipado, acaba nos levando de volta ao conceito pré-concebido que tínhamos no machismo. Nesse caso, é como se disséssemos que apenas aquelas mulheres capazes de dar a luz a criança, sejam as únicas que possuem alta capacidade de meiguice, doçura, bondade, paciência e cuidado.

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Esses pontos foram levantados por duas pessoas em nossa pesquisa. O primeiro entrevistado foi o Gabriel Ferreira, que levantou primeiramente a questão das características: “Acredito que a classe de professores do sexo masculino na classe dos professores não é tão paciente quanto a das mulheres, que demonstram terem todo cuidado, paciência e dedicação com os alunos, ao contrário dos professores homens, que não são todos, mas boa parte demonstra ter pouca didática.“

Já a Luana Ferreira que atualmente tem um filho, uma mãe que também nos respondeu, abriu nossos olhos para mais uma inversão de situações, onde deixou claro e validou a opinião de muitas pesquisas em que após a entrada no ensino fundamental, a situação dos sexos nas salas de aula se inverte: “Eu só tive professores homens a partir da 5° série, até então eram só mulheres. E um professor de educação física homem. Mas depois, que você cresce, no ensino médio, faculdade e curso, o que você mais vê é professor homem. Acho que é uma escolha como citada ali em cima, de sentimentalismo e maternidade.”

Ainda de acordo com Luana, a questão cultural vem da própria criação também, e que generalizando, muitos homens acabam trazendo uma personalidade mais fria. Ao ser perguntada porque razão encontramos poucos homens na educação infantil, ela nos respondeu: “Talvez porque mulheres são mais abertas aos sentimentos que uma criança precisa. Homens geralmente são criados em uma sociedade mais fria.”

Olhando por esse ponto, se os homens também estão ali gerando e educando seus filhos, por menor que sejam suas participações ainda em relação às mulheres, o que os impediria de terem o sentimento paternalístico em sala de aula?

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Mercado blindado

De acordo com o blog do Lyceum, uma companhia especializada em gestão de cursos de educação à distância, uma das principais razões de haver desistência de cursos é a pressão social, onde sinalizam que as últimas gerações de millennials e centennials (gerações Y e Z), elas estão tendo uma liberdade de escolha maior, além do questionamento de vários parâmetros do sistema brasileiro de educação.

Apesar disso, nessa pesquisa, nós acabamos levantando pontos importantes com nossos entrevistados. Além do preconceito contra a igualdade dos sexos, que infelizmente ainda existe, a busca por essas oportunidades também acabam sendo pouco incentivadas pelos representantes do sexo masculino. De acordo com Cecília Rocha, que além de professora, é mãe de dois filhos, a falta de igualdade entre a presença masculina e feminina nas escolas, acaba criando um ambiente blindado a majoritariedade das mulheres: “Muitos homens não entram para o magistério, muitas vezes exatamente porque essa área é dominada por mulheres. Aí vira um círculo vicioso.”

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A desigualdade prevalecendo em todos os sentidos

Além disso, temos que debater a questão salarial, que apesar de nossa pesquisa se restringir aos primeiros anos da educação básica, vale ressaltar que mesmo em um ambiente onde se tem mais mulheres trabalhando, de acordo com uma postagem divulgada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), no site da Agência Brasil, entre 2012 e 2016, as mulheres do ensino universitário estavam ganhando apenas 75% do que os colegas homens ganhavam de salário. Isso só mostra que além da pouca presença dos homens no setor educacional, eles ainda sim venciam no salário, se dando numa média de R$ 1.764 para R$ 2.306 como média mensal.

Voltando ao ensino básico, que é o principal foco desse artigo, de acordo com Márcia Moraes, que é mãe de dois filhos, nessa fase a média salarial se torna inversa, o que também acaba sendo um desânimo para que os homens decidam escolher uma vaga na educação: “Acredito que eles são tão capazes quanto às mulheres. Apenas penso que ainda existe preconceito em relação ao sexo masculino na educação infantil. Também acho que a má remuneração contribui para a baixa procura desse cargo.”

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A educação é uma honra para todos

Apesar de tudo que discutimos nesse artigo em relação ao desequilíbrio entre o homens e mulheres na educação, em todas as respostas que tivemos na nossa pesquisa, uma coisa ficou muito clara: todos os professores são especiais para que possamos melhorar na nossa sociedade.

Para a nossa entrevistada Miriam Ramos Rocha, que além de professora, também é mãe de dois filhos, a preocupação maior além do nível de aprendizagem e do bom relacionamento, é que todos busquem fazer o que os fazem felizes: “Tudo é uma questão de cada um buscar o trabalho e tudo mais na sua vida que lhe traga mais felicidade. E as pessoas respeitarem as escolhas de cada um.”

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No dia 15 de outubro, é celebrado o Dia dos Professores no Brasil, e pensando nisso, decidimos citar alguns exemplos de homens e mulheres que através de seus talentos em sala de aula, transformaram a vida não só dos alunos que estavam em suas classes mas, do mundo inteiro. Finalizamos citando os exemplos de Albert Einstein (Professor de física na Universidade de Berna, Universidade Carolina e Instituto Federal de Tecnologia de Zurique), Johann Heinrich Pestalozzi (criador do “Método Pestalozzi”, defendia uma pedagogia humana e afetiva, tendo a escola como uma extensão do lar das crianças, onde elas se sentissem seguras e protegidas), Paulo Freire (considerado um dos pensadores mais importantes na história da pedagogia mundial), Isaac Newton (construiu o primeiro telescópio refletor operacional e criou a teoria das cores, dentre outras descobertas), Jean Piaget (sua principal teoria é a da Epistemologia Genética, que explica como o conhecimento é adquirido e organizado na mente humana, desde a infância até a fase adulta).


“Esse texto foi uma homenagem à todos os heróis que apesar de muitas vezes nao encontrarem condições que nosso país consiga proporcionar, ainda conseguem enxergar uma luz na humanidade.” – Luca Moreira

Caso queira vir conversar com a nossa coluna sobre suas experiências e pontos de vistas, deixamos o canal de comentários abaixo disponível para nossos leitores.

A nossa coluna agradece a todas as fontes e participantes que dedicaram um tempo para responderem essa pesquisa.

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